Umberto Eco: A Insuportabilidade do Silêncio.

Recordando Umberto Eco, investigador e romancista italiano recentemente falecido, também reconhecido admirador de Banda Desenhada.

2016 parece ser categorizável como o ano assassino, cujo início tem sido marcado pelo desaparecimento de personalidades marcantes que, mais do que figuras públicas, se tornaram parte integrante do cerne da nossa cultura.

No passado dia 19 de Fevereiro foi a vez de Umberto Eco, pensador italiano conhecido do grande público por romances como O Nome da Rosa e O Pêndulo de Foucault, pelos académicos pelos seus estudos sobre semiótica, e por qualquer um que tenha tirado mestrado em ciências sociais pelo lendário manual Como Se Faz Uma Tese Em Ciências Sociais e Humanas.

Homem de muitos e assumidos interesses culturais, tinha uma forte admiração pela cultura popular, e era um confesso apaixonado por Dylan Dog, personagem de Fumetti criada por Tiziano Sclavi para a editora Bonelli. Dylan Dog, indagatore dell’incubo, é quase desconhecido em Portugal, onde só chegam as reedições brasileiras de Julia e Tex, outras séries da editora.

«Posso leggere la Bibbia, Omero o Dylan Dog per giorni e giorni senza annoiarmi»

Bíblia, Homero, Dylan Dog. Nesta frase, o semiólogo e romancista recorda-nos a importância da sedução do imaginário, independente de questões de importância cultural ou género literário. Sclavi retribuiu a admiração, homenageando Eco numa aventura de Dylan Dog publicada em 1998. Em Lassù qualcuno ci chiama (Dylan Dog #136), Eco é Humbert Coe, semiólogo e linguista, envolvido com Dylan numa trama misteriosa numa zona remota do País de Gales.

A admiração de Eco pela banda desenhada não se restringia a Dylan Dog. Este intelectual italiano sublinhava o seu potencial enquanto meio de comunicação de massas. Eco foi um daqueles espíritos raros que conseguiu fazer a ponte entre culturas eruditas e de massas, não as desvalorizando como simplistas ou simplesmente populares.

Um aspecto evidente num dos seus romances, obra admirável mas menos conhecida de Eco pelo grande público, A Misteriosa Chama da Rainha Loana. Neste livro sobre a recordação dos passado esquecido, as memórias dolorosas da Itália na II Guerra Mundial, entre o fascismo e a resistência, são entrecortadas pelo fascínio pelas aventuras pulp e o Rato Mickey, imortalizado como Topolino  (em Itália) por um regime repressivo que tentou limpar o referencial americano do personagem para que não exercesse influências perniciosas sobre uma juventude que se queria como berço do novo homem fascista.

A voz de Eco silenciou-se. Fica a imensa bibliografia, académica, cultural e ficcionista, e a sensação de insuportabilidade do silêncio.

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