Nelson Dona: “Existem poucos eventos que tenham uma longevidade tão grande”

Está a decorrer o AmadoraBD 2014, a 25ª edição do festival internacional de BD da Amadora em tempos conhecido como FIBDA.

O aCalopsia entrevistou Nelson Dona, director do evento que, ao longo de um quarto de século, tem trazido a Portugal alguns dos nomes mais relevantes da BD mundial, seja presencialmente para contacto com os leitores ou através de originais, em alguns casos verificando-se ambas as situações.

O AmadoraBD é um cartão de visita da cidade da Amadora, um evento local de dimensão nacional e projecção internacional. Ao longo dos seus 25 anos tem tido um papel fundamental no mercado e as questões que o afectam extravasam o nível local, contudo não pode ser esquecido que é um evento organizado por uma autarquia e que deve ter também um papel no concelho da Amadora.

Este ano o festival convida os visitantes a uma reflexão sobre a realidade da BD na sociedade da informação, realçando a evolução que existe a nível de público e dos meios de produção, edição e distribuição. Porém, é também premente uma reflexão sobre os 25 anos de um evento que conquistou um lugar único no panorama cultural nacional, em particular a nível da banda desenhada.

01 – Os constrangimentos da organização

Bruno Campos (BC): Começando pelo seu início em 2000, quando assume o cargo de director do AmadoraBD, qual era a avaliação que fazia das edições anteriores, e quais as mudanças que pretendia implementar?

Nelson Dona (ND): Assumi a direcção em 2000 mas já trabalhava no festival antes de 2000 e nessa altura o que nós percebemos é que o festival tinha atingido uma dimensão nacional de alguma importância, fazia já parte do calendário internacional de eventos dedicados à banda desenhada.

O que na altura propus (e tem sido esse o caminho que temos estado a trabalhar) foi deixar de fazer apenas exposições dentro do âmbito editorial – que promoviam [só] os livros e que em boa parte eram mostras. Nós convidavamos um artista, o artista escolhia as peças e mandava-as sem muito mais informação. Percebemos que existia uma potencialidade de fazer as coisas de outra forma e a primeira questão que nós levantamos foi a hipótese de termos um tema todos os anos. Esse tema em anos anteriores chegou a ser, por exemplo, um país convidado ou outras coisas. A ideia foi passar a trabalhar um tema de forma mais profunda, sendo que o tema poderia ser de ordem mais narrativa num género de banda desenhada, podia ser de ordem mais técnica ou podia ser um tema mais geral – em termos da sociedade – onde a banda desenhada tivesse importância. Foi a primeira proposta que fiz quando assumi a direcção.

A segunda foi relativamente às exposições dos premiados (a Amadora tem os Prémios Nacionais de Banda Desenhada), [passando] esses autores a serem os autores em destaque no ano seguinte. Isso por si não foi uma novidade total, nós já fazíamos isso mas um bocadinho em função das possibilidades ou não. Passou a ser uma decisão que ficou regularizada de um ano para o outro. Os autores quando ganhavam um prémio já sabiam que no ano seguinte iam ser autores em destaque na Amadora.

Depois existiam duas questão operacionais – que não aconteceu logo nos primeiros – uma de ordem logística em função do espaço. Nós na 10º edição ainda fizemos o festival na Fábrica da Cultura, a partir daí a Fábrica deixou de ficar disponível por questões de segurança, e passamos a fazer o festival em outros locais. A adaptação do festival ao outros locais até chegarmos aqui ao Fórum levantava em si mesmo questões muito complicadas de resolver e que ano após ano, por razões diversas, nos tomava muito tempo de trabalho. E por último o facto de o festival passar a ser até ao 10º co-produzido com uma entidade externa. Não me recordo exactamente, mas presumo que a partir do 12º ele passou a ser produzido inteiramente pela Câmara Municipal da Amadora o que levanta questões logisticas e de ordem burocrática e processual (em termos jurídicos) que são desafios difíceis, às vezes, de trabalhar mas conseguimos todos os anos fazer o festival, mesmo num dos anos mais dramáticos: há três anos quando toda a legislação de compras públicas foi totalmente alterada – aliás foi totalmente anulada no orçamento de estado – entre Janeiro e Abril nós ficamos sem lei, porque a legislação dizia que as compras públicas não podiam ser feitas de determinada forma mas remetiam para nova legislação que só saiu pouco [tempo] depois.

BC: Qual é a importância que a legislação de compras públicas tem para o festival, em que medida isso afecta directamente a organização do festival? Quando se fala de compras a maioria das pessoa pensa na compra de um bem físico. O Festival da Amadora não vai comprar nada.

ND: Também compra bens físicos, compra material (por exemplo) para as cenografias ou outras coisas. A maior parte das compras são de são prestadores de serviços, desde empreiteiro que constrói a obra até todas as pessoas, prestadores de serviços que trabalham para o festival durante [todo] o ano em termos de produção ou, mais concretamente, durante estes 17 dias. Estamos a falar dos cenários dos comissários, de autores de textos, toda a equipa de apoio aos visitantes, equipa de produção em geral, equipa de montagem, todas estas equipas são contratadas a recibos verdes: isto configura-se dentro das compras públicas.

E depois também a compra de toda a parte de design gráfico, de comunicação, a publicidade, as viagens dos artistas (por exemplo) que tivemos nos últimos anos bastante dificuldade em comprá-las, porque a legislação colocava muitas objecções a viagens em geral, não interessava para quê. Estamos a falar de coisas que são o cerne do festival: estamos a falar das exposições, estamos a falar da presença dos artistas e estamos a falar da comunicação do festival e sem que esses assuntos – do ponto de vista jurídico e do ponto de vista contratual – estejam resolvidos nós não podemos avançar com eles para a rua, não podemos fazer comunicação sem termos a compra da comunicação devidamente acertada e contratualizada.

Este ano, só para ter uma ideia da dificuldade, nós tivemos três levas de legislação que alterava completamente a forma de fazer as compras públicas. Num mesmo ano nós regramo-nos por três regras diferentes, a legislação foi sendo sempre alterada em função do chumbo do tribunal constitucional de uma série de normas que o governo queria implementar.

Não há entidade que consiga organizar trabalho [quando] não sabe quais são as regras com que vai ter de trabalhar, e essas regras têm implicações muito difíceis de resolver.

Portanto, é uma parte muito pesada no nosso trabalho, e que não existia antes no festival.

BC: O que motivou a Câmara a assumir por completo a organização do festival, em vez de continuar a co-produzi-lo como nas primeras edições?

ND: Foi uma decisão de ordem técnica e política, em primeiro lugar porque do ponto de vista legal nessa altura, em 2000, a legislação também tinha sido alterada e [o] permitia. [Existiram] funções que foram transferidas para as autarquias que anteriormente as autarquias não tinham ou dificilmente poderiam executar. Foram transferidas responsabiidades legais e também meios operativos para poder concretizar os projectos. Por isso, nessa altura, houve uma decisão [de] avançar. A outra de ordem técnica prendia-se com a própria reorganização dos serviços, o que até hoje tem estado a ser trabalhado, é um trabalho em progresso constante.

As co-produções correram (do ponto de vista operativo) sempre bem mas chegou-se à conclusão de que não eram a melhor forma de fazer o festival. Como não era a melhor forma, decidiu-se fazer aquilo que julgávamos (na altura) que seria o modo mais ágil, operativo e eficaz de resolver a questão.

BC: O Centro Nacional de Banda Desenhada e Imagem (CNBDI) quando é criado surge como coorganizador do AmadoraBD. Neste momento essa situação já não se verifica, pelo menos a nível da comunicação que é feita pelo festival. A que se deve essa situação?

ND: O CNBDI – tal como o festival – não é uma entidade em si mesmo, não tem número de contribuinte próprio, é um serviço da Câmara Municipal da Amadora. E essa retirada do logo do CNBI dos cartazes não se prende com a não participação do CNBDI na organização do festival, porque o CNBDI e o festival sempre foram a mesma equipa, nós agora estamos até separados fisicamente, mas os membros, em particular uma das pessoas, continuam a participar na organização do festival. Isto prende-se com uma decisão camarária mais abrangente de renovar a imagem e a marca da própria Amadora, o logótipo e toda a marca da cidade da Amadora que deixou de ser o brasão e passou a ser um outro logotipo e toda uma outra gestão de marca. Dentro dessa gestão de marca há um hierarquia e uma decisão de os restantes logotipos – de equipamentos – deixarem de existir.

O facto do CNBDI não aparecer nos cartazes ao lado da organização da Câmara Municipal da Amadora não significa que o CNBDI não tenha participa na organização do festival, significa apenas que existiu uma alteração na gestão da própria marca. Porque as pessoas (que é o maisimportante) as pessoas que participam, não são todas mas em parte, participaram também na organização do festival.

BC: Mas em termos da morada do comissariado deixou de ser a do CNBDI para passar a ser outra, pelo menos a nível dos concursos de BD, que em 2013 era a morada do CNBDI, situação que não se verificou este ano. Não costumava existir uma ligação maior entre o Festival e o CNBDI?

ND: Foi menor este ano que o ano passado e no CNBDI (enquanto serviço da Câmara Municipal da Amadora) as cartas que saem, saem todas pelo mesmo sítio, que é pela Câmara Municipal da Amadora. As que entram podem entrar para a Câmara Municipal Da Amadora dentro de diversos locais onde a Câmara tem serviços. Aqui foi uma questão operacional, apenas porque as pessoas que iam tratar do concurso este ano não eram as mesmas do ano passado, deu-se a morada dos concursos, e o comissariado instalou-se de facto nos Recreios da Amadora, em particular a direcção que eu assumo.

BC: A direcção do CNDBI e do AmadoraBD é a mesma?

ND: Não, a direcção do CNBDI é coordenado pela Drª Cristina Gouveia, o festival é coordenado por mim, Nelson Dona, e eu estou fisicamente nos Recreios da Amadora onde está a divisão de cultura.

BC: Antes de existir essa reformulação, a criação dos dois serviços distintos, o Nelson Dona coordenava o CNDBI?

ND: Não, sempre fui só o director e o coordenador do festival de banda desenhada, e sempre existiu a colaboração do CNDBI por parte da Cristina Gouveia que era, e continua a ser, a coordenadora do CBDI.

BC: Não seria mais prático o CNDBI ser o serviço que organiza o AmadoraBD, já que é o CNDBI que durante todo o ano garante a programação a nível de BD dentro da política cultural da Câmara Municipal da Amadora?

ND: Isso tem apenas a ver com uma divisão de tarefas, o que acontece é que o festival não é produzido em apenas dois ou três meses, é uma produção [feita] durante o ano inteiro, nós em cada ano estamos a trabalhar na produção do ano seguinte, e estamos a trabalhar na produção desse mesmo ano, É um trabalho de ano inteiro. Por outro lado, o festival tem as suas próprias caracteristicas enquanto evento, tem como propósito a concentração de actividades ao mesmo tempo e muito público ao mesmo tempo, e trabalhamos dessa forma.

Enquanto que o CNDBI tem como propósito um trabalho mais regular durante todo o ano e um trabalho grupo a grupo, turma a turma, visitante a visitante, é um trabalho estruturado de outra forma, por estar aberto durante o ano todo. Esse mesmo trabalho tinha de ser feito em paralelo, portanto foi uma questão de divisão de tarefas.

A Drª Cristina Gouveia ficou responsável pela coordenação de todo o trabalho durante o ano no Centro de Banda Desenhada e trabalhar também no âmbito do festival, [em termos de] coordenação editorial, e eu fiquei com a coordenação do festival, porque durante todo o ano tenho de estar concentrado também na possibilidade de o festival acontecer de forma efectiva.

Foi uma questão operacional, essa decisão não se prendeu com outro tipo de ordem. Até porque até trabalhamos sempre os dois muito em parceria, e trabalhamos muito bem os dois em parceria, portanto nunca se levantou um problema relativamente a isso.

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BC: Quais são os critérios para a escolha das exposições que vão estar patentes no AmadoraBD?

ND: Em primeiro lugar o tema que se escolhe para cada ano dá lugar a uma exposição central, e dá lugar depois a outras exposições que lhe são adjacentes e à presença de autores, etc. Esse é um dos três eixos do festival.
O segundo eixo são os prémios de cada ano, os premiados deste ano dos PNBD serão programação em destaque do ano seguinte, esse é o segundo eixo.

O terceiro eixo prende-se com as novidades editoriais e prende-se com as efemérides importantes em termos editoriais. É caso este ano dos 50 anos da Mafalda os 75 anos do Batman, mas também novidades particularmente interessantes como é o caso do livro do Matthias Picard, Jim Curioso, que trazem uma inovação e uma vanguarda particularmente interessante ao universo da banda desenhada portuguesa. E, quando digo portuguesa não digo de autores portugueses.

BC: A exposição do Jim Curioso é a única novidade editorial que tem direito a uma exposição individual este ano no AmadoraBD?

ND: Sim, exactamente.

BC: O festival não está demasiado centrado no passado, ou seja, nos premiados do ano anterior, ignorando as novidades editoriais que estão a ser publicadas?

ND: Esse equilibro é feito cada ano em função da restante programação. Quando nós resolvemos fazer uma exposição central que está absolutamente organizada em torno daquilo que é a contemporaneidade, em torno de escolhas de livros com três, no máximo cinco anos, e algumas excepções com no máximo dez anos, da última década. Mas, a maior parte dos livros e dos autores que foram escolhidos foram trabalhos dos últimos três anos. Portanto, temos uma exposição central que é em torno da contemporaneidade, e os autores que vêm (também nesse âmbito) são da contemporaneidade.

Como ainda por cima os prémios do ano passado foram muitos, felizmente, porque havia uma diversidade de oferta muito grande, em particular na banda desenhada portuguesa, e o espaço é o espaço que temos: não temos mais espaço, houve que organizar a programação em torno disso. De facto, no terceiro eixo existe uma exposição apenas sobre novidades editoriais, mas na verdade também temos novidades editoriais na Mafalda, que é uma das efemérides.

BC: O álbum da Mafalda saiu recentemente, mas o lançamento não foi no AmadoraBD e a exposição nem contém originais.

ND: Sim, porque eles não estão disponíveis ao público, foi (é) uma opção da familia do Sr. Quino. Em primeiro lugar muitos deles perderam-se, é preciso não esquecer que até aos anos 60/70 os originais não tinham grande valor e eram na sua maioria deitados fora depois de serem publicados, depois de serem reproduzidos eram deitados fora, ou sejam muitos deles não existem efectivamente. Outros desapareceram no periodo da ditadura, porque levantavam questões particularmente agressivas para os ditadores argentinos até aos anos 80, os poucos que existem a familia do Quino decidiu não os disponibilizar.

Não estiveram na exposição de Angoulême, a grande exposição de Angoulême deste ano também não teve originais, nem a de Bolonha, nem a de Barcelona. Não existem disponíveis, na maior parte dos casos porque não existem fisicamente, os poucos que existem a familia não disponibiliza.

BC: A exposição central, Galáxia XXI, pode ser contemporânea, mas é uma contemporaneidade inédita em Portugal.

ND: Também, tanto que nós quisemos fazer um olhar do panorama internacional incluindo nesse panorama internacional aquilo que é a realidade portuguesa, e dentro da realidade portuguesa temos quer os livros recém-publicados em Portugal, quer os autores portugueses em concreto. E portanto, esse olhar é efectivamente um olhar internacional e não apenas para Portugal.

BC: Mas não falta a presença das obras que estão a ser editadas em Portugal, das obras de autores estangeiros que são editados cá e que podem atrair o público?

ND: Na nossa opinião não, mas estão cá vocês, público, e em particular vocês, comunicação social – que nos dá o maior apoio na divulgação – para também darem a vossa opinião. As opções de programação que tomámos foram efectivamente aquilo que está presente, é aquilo que nós queriamos apresentar. E dentro dessa exposição central existem vários livros disponíveis no mercado português apenas durante este último ano, inclusive alguns de áreas de edição de autor, etc.

BC: Na exposição Galáxia XXI só existe uma obra que irá ser publicada: Cachalote, de Rafael Coutinho, que vai ser editado pela Polvo. Todos os restantes trabalhos vão continuar inéditos em Portugal.

ND: Há outros livros também, os livros da El Pep, os livros…

BC: A El Pep está presente também na exposição dedicada ao Nuno Duarte que é é um dos autores da editora, mas eu não estava a falar do trabalhos de autores portugueses que até estão bem representados, e começam a ter um peso que não era habitua no festival. Eu referia-me ao desaparecimento de nomes, estrangeiros, mais sonantes que poderiam atrair o grande público.

ND: As opções tem sempre dois vértices, dois lados- Sempre que nós tomamos uma opção estamos a excluir outra.

BC: Não é possível um equilibrio?

ND: Esse equilibrio nós procuramos através da exposição central, como disse, quer através de uma grande biblioteca que este ano disponibilizamos para o público, onde vão estar presentes os livros todos para as pessoas lerem não em exposições (com originais) mas com os livros em si mesmos disponíveis. Sendo que é uma opção editorial do festival que tem a possibilidade de crítica, como tudo, é uma opção editorial do festival o trabalho sobre os livros que estão firmados no mercado.

Nós julgamos que os livros precisam de algum tempo no mercado para conseguirmos perceber se eles tem menor ou maior relevância no mercado português, e como é que o público reage aos álbuns, porque pode haver álbuns que [em outros] mercados têm uma relevância e uma adesão ou que, mesmo sem muitos leitores, tenham uma importância artistica que os torna relevantes e no caso português não acontece assim.

E eu dou o exemplo não de um álbum em concreto, mas de um género que tem uma importancia gigantesca noutros paises, e que em portugal tem importância, mas não a mesma que é o caso do mangá. Em Espanha justifica-se um festival apenas para o mangá, em França tem também uma importância muito grande, em Portugal tem importância mas não tem o mesmo nível percentualmente de importância que tem noutros paises.

BC: The Walking Dead é uma série que já tem editados 10 volumes, assim como Death Note, ou seja, existe um público que tem interesse nessas obras.

ND: Exactamente

BC: The Walking Dead para além dos álbuns é uma série que passa na televisão e que tem um impacto bastante grande. A presença de… Já não vou falar do Robert Kirkman, que é um autor caro, mas a presença do Charlie Adlard, o desenhista da série por exemplo não seria algo que poderia trazer mais público ao festival?

ND: Olha, não foi uma opção deste ano, eventualmente poderá ser uma opção para o ano…

BC: O festival não está a renegar a matriz popular que lhe deu projecção, que foi a presença de autores como Morris, Bilal e outros, que atraem o público? Não deveria existir um nome grande que pudesse ser o cabeça de cartaz do AmadoraBD e justificar a vinda do público em massa?

ND: Na nossa opinião, para este ano não. Neste e nos outros anos, pegando apenas no exemplo do festival deste ano: nós temos para o grande público. Temos quer na exposição central….

BC: Não estava a falar de exposições mas da presença de autores.

ND: A presença dos autores, nós centramo-nos na presença de autores em torno do Batman e do Surfista Prateado (que são personagens particularmente importantes) e depois em termos da opção editorial que tomamos de fazer a exposição central desta forma, também nos centramos em autores que fizessem parte desse universo. Sendo que o festival da Amadora é um festival generalista e que quer não só apresentar grandes nomes, mas também fazer propostas de autores que não são de todo conhecidos em Portugal, mas que através do festival ou passam a ser publicados, ou já foram publicados e têm outra relevância no mercado.

BC: Considera que Joe Staton e Tom Grindberg são dois nomes conhecidos do grande público português?

ND: Não diria que eles são conhecidos do grande público português, são conhecidos particularmente pelos grandes fãs de banda desenhada americana.

BC: São autores que não têm – pelo menos que eu saiba – um álbum publicado em Portugal.

ND: Exactamente.

BC: E não são autores que fariam até mais sentido na exposição Galáxia XXI do que na exposição do Batman e Surfista Prateado?

ND: Eles foram convidados no âmbito da exposição do Batman e Surfista Prateado.

BC: Eu estou a dizer isto porque actuamente o que ambos os autores andam a fazer são tiras semanais para a net, e até poderia ser um tópico de conversa com os autores o facto de as tiras de BD terem reencontrado uma nova vida na internet, incluindo séries que foram popularizadas pelos jornais, como é o caso de Dick Tracy e Tarzan.

ND: Sim, isso era uma possibilidade, não foram as opções porque é preciso não esquecer que para além das opções editorias da direcção do festival, da equipa do festival, existem comissários que são convidados para fazerem as exposições, neste caso as duas exposições em concreto, a exposição do Batman e a exposição do Galáxia XXI tinham comissários, portanto existe uma leitura sua que é respeitada porque senão não os convidavamos a eles, e não lhes reconheciamos mérito para que assim fosse.

Evidentemente que as opções são sempre criticáveis positiva ou negativamente ou só de forma construtiva, mas foram as opções tomadas.

BC: A escolha dos autores passa unicamente pelos comissários ou passa também pelo director do festival, pela direcção do festival?

ND: É um trabalho cruzado, porque há relativamente aos comissários uma sugestão mas depois o trabalho de contacto e de efectiva concretização passa pelo festival.

E aqui é que vem a explicação relativamente a algumas coisas que sucedem que tem implicação directa com as questões burocráticas e os constrangimentos (legais e operativos) que nos são colocados pelo orçamento de estado, e pela legislação que o governo vai editando durante o ano sobre contas públicas. Por exemplo: visto que havia um constrangimento bastante grande para a compra de viagens, nós só no início de Outubro é que pudemos começar a ter a certeza de que poderíamos ter determinados autores cá. E há autores que já não têm disponibilidade nessa altura.

BC: Isso não é muito tarde para convidar autores?

ND: Nós convidamos muito antes, mas para confirmar os vôos. É muito tarde, mas isso prendia-se com uma questão operativa e legal a que nós não podemos fugir, portanto são estes constrangimentos que nos levam depois a ter de tomar algumas opções ou a não conseguir ter disponiveis algumas opções, neste caso alguns artistas que já não estavam disponíveis para vir a Portugal.

BC: Porque não existem mais autores, convidados das editoras, presentes? O que faz com que as editoras tenham deixado de investir no festival deixando de ter cá autores estrangeiros para promoverem os seus trabalhos que são editados?

ND: Não se passa com todas as editoras, a Kingpin vai trazer por si mesma um autor hispano-nipónico [JM Ken Niimura] mas essa é uma questão que creio só mesmo os editores poderão responder. Se é pelo festival em si, por os convidados que a Câmara Municipal Da Amadora traz serem suficientes, para alimentar também as próprias promoções em que as editoras tem interesse. Se é por isso eu não sei responder.

Neste momento o panorama editorial português tem uma diversidade muito grande, mas pode ser também por uma questão de disponibilidade da verba que têm (ou não) para esse fim. Essa questão deve ser antes de mais respondida pelos próprios editores.

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02 – Amadora sem Contos de Fadas

BC: A Levoir (representada pelo José Hartvig de Freitas) pretendia ter cá o CB Cebulski e ter em exposição trabalhos ilustrados por autores portugueses, a propósito da edição do Contos de Fadas Marvel, editado na colecção Universo Marvel em parceria com o Público uma semana antes do início do AmadoraBD. Porque é que o festival não teve interesse nessa exposição e em trazer cá esse autor?

ND: Nós tinhamos interesse em fazê-lo, foi uma questão operativa do ponto de vista de espaço, nós temos recursos limitados (não só em termos de espaço fisico) portanto temos de tomar opções. A nossa opção foi: “para fazer uma coisa não podemos fazer outra” e não era possível fazer essa exposição.

BC: A presença desse autor e dessa exposição com uma obra que foi editada uma semana antes do início do festival, não permitiria ao AmadoraBD uma sinergia com o jornal Público que permitiria a projecção, chamar a atenção para o festival?

ND: Sim, permitiria mas, como disse, as opções foram outras, portanto criamos outro tipo de sinergias com outras pessoas e outras edições.

BC: Há pouco mencionava o facto de a maioria das editoras portuguesas ser relativamente pequena, algo que não é o caso da Levoir, que tem a particularidade de ser “representada” pelo José Hartvig de Freitas que é também editor-assistente da Panini e G. Floy. Não seria uma presença que poderia trazer nomes de peso, nomeadamente no âmbito das exposições de Batman e Surfista Prateado? Não seria uma parceria preferencial?

ND: Seria e foi, e por isso…

BC: A presença do Joe Staton no âmbito dos 75 anos de Batman não tem qualquer relação com qualquer obra editada em Portugal.

ND: Os autores que foram editados pela Levoir e pelo Público foram eles mesmo contactados,mas não estavam disponíveis para viajar e neste caso não era para a Amadora, Portugal, não estavam disponíveis para viajar neste período porque têm compromissos editoriais, têm livros que têm de sair e portanto não era possível. Além de que parte deles já não estão entre nós e então esses ainda menos.

BC: Existem autores que foram publicados nas colecções da Levoir e trabalham no mercado norte-americano – só mencionando os dois nomes maiores, que são o Brian K. Vaughan e o Carlos Pacheco – que vão estar presentes na Comic Con Portugal.

ND: Exactamente, mas neste período de Outubro não estavam disponíveis. Eles foram devidamente contactados. Não estavam disponíveis porquê? Cada vez mais em termos internacionais, em particular no mercado franco-belga e no mercado americano (já para não falar no japonês, que nesse caso os contratos são absolutamente castradores relativamente aos autores) os contratos dos editores com os autores dizem que se eles não tiverem determinadas partes dos trabalhos entregues, em determinado momento, eles não podem sair para eventos ou outro tipo de actividades. Portanto, eles estão dependentes de terminarem os trabalhos em determinada data que corresponde a esta que nós estamos, não esquecendo que logo a seguir temos os lançamentos de Natal e que no mercado europeu tudo tem de estar pronto para Angoulême, em Janeiro.

Eu diria que no pós-Verão, no caso europeu, existem três momentos: um relativo ao mercado português apenas, que diz respeito ao AmadoraBD e muitos dos livros são preparados para serem editados imediatamente antes, durante ou imediatamente a seguir ao AmadoraBD, mas depois em termos internacionais isso não se passa em Outubro, passa-se em Novembro relativamente às edições para o Natal e durante esse período também são preparadas as coisas para Angoulême, os grandes lançamentos são feitos em Angoulême que continua a ser o maior evento mundial. E por isso esses foram efectivamente contactados, mas não estavam disponíveis para viajar, para lado nenhum.

BC: O Brian K Vaughan não tem esses constrangimentos a nível de editores já que é o seu próprio editor… E temos a situação caricata de termos o lançamento de Saga durante o AmadoraBD, mas quem quiser autógrafos do autor tem de aguardar até Dezembro pela Comic Con Portugal. E séries como Walking Dead também não têm esses constrangimentos (por serem editadas fora das grandes editoras), mas são séries de sucesso e que têm impacto junto do público.

ND: Mas qualquer entidade e o festival em particular pode convidar artistas a virem à Amadora, não pode é obrigá-los a vir, portanto nós convidamo-los e fazemos um esforço muito grande e explicamos tudo muito bem. Se as pessoas não quiserem vir nós não podemos obrigá-las a vir. Não podemos ir a casa deles, agarrar neles e enfiá-los dentro de um avião, portanto os convites foram dirigidos e as pessoas aceitaram ou não aceitaram.

Eu queria só somar uma ideia aquilo que há pouco disse sobre a edição da Levoir, a outra edição que acabamos por não expor, é que o festival ao ser um festival generalista tenta apresentar também a nível editoral, não só nos géneros que são apresentados ao público, [mas] também para as diferente faixas etárias e também naquilo que é o mercado editorial. De facto da Levoir nós já tinhamos duas exposições este ano, através do Surfista Prateado e através do Batman.

BC: Não podiam trocar a exposição dos Contos de Fadas pela exposição do Surfista Prateado?

ND: Era um prémio da Amadora, portanto não fazia sentido nós dispensarmos esse prémio [sendo] uma personagem particularmente interessante, diversa e que, de alguma forma, complementa aquilo que é o Batman.

BC: O AmadoraBD não está a ficar demasiado dependente dos prémios a nível de exposições? Só a Alison Blechdel é que ganhou um prémio em 2013 e não tem uma exposição.

ND: Ela não estava disponível para vir à Amadora.

BC: Mas se estivesse, haveria uma exposição?

ND: Haveria, sim.

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BC: Mas estar definido que tem de haver uma exposição não acaba por ser contraproducente em casos em que se calhar a presença de uma exposição que até podia ser mais barata e poderia permitir uma sinergia com um orgão de comunicação social? O AmadoraBD não ficaria a ganhar se trocasse o Surfista Prateado pelos Contos Marvel?

ND: Na nossa opinião não, pensamos que a opção correcta foi a que tomámos. Também porque nos parece que os livros e os autores precisam de algum tempo no mercado de relação com o público para que nós possamos apresentar, não podemos esquecer que nós podemos ter duas prespectivas de leitura nesta questão relativa aos prémios, se por um lado podemos olhar para a questão como algo como a apresentação de alguma coisa que já pertence ao ano anterior, por outro lado nós também podemos olhar para este assunto como uma nova vida para os livros. É preciso não esquecer que cada vez mais os livros têm um periodo de vida máximo nas livrarias de três meses, muitos deles, e não estamos a falar dos livros de banda desenhada, estamos a falar dos livros quase todos, muitos deles estão 15 dias nas grandes livrarias e passados 15 dias são retirados e vão para fundo de catálogo. E o período máximo é três meses, isto é um estudo a nível internacional, não é uma questão portuguesa.

O festival da Amadora permite uma segunda vida aos livros um ano depois, porque eles tiveram alguma relevância, porque quando foram apresentados ao público houve um júri que decidiu que eles tinham qualidade, que mereciam ser destacados. Esta perspectiva parece-me também importante e é aquela que nós adoptamos no festival, se este livro tem importância (um ano não é assim tanto tempo) então um ano depois nós vamos dar o devido destaque e vamos dizer: “vale a pena olhar para este livro, e vale a pena que este livro fique na história da banda desenhada em Portugal”.

BC: As colecções da Levoir não têm 15 dias de vida, nem voltam às livrarias porque eles não foram para as livrarias, são colecções lançadas para os quiosques que têm uma semana de vida por isso um ano depois do prémio, uma exposição dedicada a um livro da Levoir acaba por não ter qualquer impacto a nível das vendas.

ND: Têm porque o Público continua a disponibilizar inclusive coisas que publicou há 10 anos atrás.

BC: Sim, mas isso é se as pessoas forem à procura [em loja ou na loja virtual], não vai existir um regresso às livrarias como pode acontecer com um álbum “convencional” que pode ser redistribuido pela editora, colocar um autocolante e utilizar o prémio para vender de novo o livro, quer aos livreiros para eles lhe darem destaque, quer aos leitores. No caso das edições da Levoir isto não acontece, porque já não vai haver essa redistribuição da obra, ou seja, a obra não vai ganhar uma segunda vida.

ND: Tem acontecido nas livrarias especializadas, tem acontecido livros da Levoir (que são distribuidos pelo Público) irem para as livrarias especializadas, em função de haver uma procura por parte dos leitores, portanto agora não diria que é tão generalizada, exactamente como referiu, mas tem acontecido ter livros que voltam às livrarias, em particular as especializadas.

BC: Mas para a Levoir se calhar existe um interesse maior em promover aquilo que está a ser editado, até porque a conjugação A conjugação do factor autores portugueses publicados na Marvel e exposição no AmadoraBD dava espaço para o jornal Público promover essa obra em particular e para a colecção em si. Isto poderia ter uma influência directa no mercado no momento em que as coisas estão a acontecer.

ND: Mais uma vez repito, não foi uma opção nossa. Sempre que nós escolhemos uma coisa temos de por outra de lado, não é possível ter tudo. E portanto nós entendemos este evento, é antes de mais um evento cultural, tem uma feira do livro, mas o nosso papel é promover os livros de banda desenhada, promover a leitura de banda desenhada, não livros em concreto de determinadas editoras. Nós temos uma certa distância do mercado, diria mesmo equidistância do mercado de modo a que possamos não estar a trabalhar para as editoras, nós trabalhamos com as editoras.

Agora é preciso também não esquecer que o festival da Amadora não termina este ano, para o ano há outro e que até lá existe o CNBDI, existem outras actividades que podem ser feitas e que podem trabalhar esse universo. Não foi de forma leviana que nós decidimos não fazer esta exposição, foi por uma questão de opção. Quer dizer, não era possivel fazer tudo, vamos ver o que é podemos fazer e no equilibrio que nos pareceu mais correcto [para o] festival foi optar por outras exposições.

BC: Deixe-me só salientar que só estou a insistir nesta exposição em particular por ser uma exposição cuja proposta não foi aceite e é do conhecimento público, ao contrário de outras, e para perceber os motivos da aceitação ou não de exposições.

ND: Sim, e isso eu entendi perfeitamente.

BC: Mencionou que era uma feira cultural e que o AmadoraBD não pode estar a trabalhar para um editora, mas este seria um daqueles casos em que era o AmadoraBD a trabalhar para a editora e a editora a trabalhar para o AmadoraBD, existem aqui contrapartidas, incluindo algumas que até poderiam ser negociadas. Não deveria existir parceiros privilegiados consoante aquilo que eles trazem ao festival?

ND: Deveria e há. O que eu disse, não me referi a uma feira cultural, referi-me a um evento cultural que tem dentro de si uma feira do livro. Porque estamos a falar de um meio de comunicação que é a banda desenhada e onde o livro é o objecto artistico mais importante. O livro hoje me dia nas suas múltiplas formas de acesso, inclusive no ecrã.
As parcerias são estabelecidas no nosso enteder de forma equidistante relativamente aos editores. E eu também disse que nós não trabalhamos para, mas COM os editores nos projectos para o festival e muitos desses projectos não poderiam ser concretizáveis sem o trabalho com os editores, por diversas razões, quer na parte de produção quer também na própria forma como as coisas são construídas.

BC: Pondo de parte os editores nacionais que estão presentes, devido aos autores que ganham os PNBD, a única exposição que é feita em parceria com uma editora é o Jim Curioso.

ND: Exactamente.

BC: Mathias Piccard é um nome que vai trazer visitantes e dar projecção ao AmadoraBD?

ND: Eu penso que sim, não é um nome muito conhecido é um facto, mas o livro em si é um livro que técnica e artisticamente – não é apenas tecnicamente, porque os livros em 3D já existem há muito tempo, mas também artisticamente – e [que devido] à temática para um público também infanto-juvenil nos pareceu particularmente relevante, portanto decidimos fazer essa exposição, porque era um livro absolutamente entusiasmente nesse sentido.

BC: Eu não estou a colocar em causa a vinda dessa exposição, ou o destaque dessa exposição, aquilo que eu questiono é só existir uma novidade editorial a ter destaque, quando temos uma actividade editorial que é rica nas ofertas que apresenta, mas não estão representadas no festival.

ND: Como respondi, no nosso entender [o AmadoraBD] consegue fazer [isso] através das outras exposições, e da outra programação que apresenta. Mas, obviamente que essa é uma opinião e é discutível, mas (na nossa opinião) essa diversidade é justificada e apresentada através das outras exposições, incluindo a Galáxia XXI.

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03 – A representatividade dos prémios

BC: Este ano a Joana Afonso é membro do júri e também está nomeada numa categoria. Não deveria ter sido poupada a essa situação?

ND: Não é uma situação nova, acontece praticamente todos os anos. Isto prende-se com o facto do mercado português e o número de autores nacionais serem o que são, não estamos a falar de uma comunidade profissional muito grande. Por outro lado, nos prémios quem é convidado é o autor em destaque, é isso que está regulamentado. Isso aconteceu com o Rui Lacas, o José Carlos Fernandes, o Miguel Rocha, o Paulo Monteiro… acontece praticamente todos os anos. O que o júri nesse momento faz é que a Joana Afonso – tal como aconteceu em todos os anos – tomou a iniciativa de se retirar do júri naquele momento em que se começaram a votar os livros nas categorias onde ela pertencia e, portanto, ela não votou nessas categorias e ficou devidamente assinalado na reunião de júri.

BC: Mas porque é que existe uma obrigatoriedade de ser um autor que ganhou um prémio no ano anterior? Existem diversos autores que não têm obra publicada e que poderiam estar nesse lugar, começando no José Ruy (que é homenageado pelos 70 anos de carreira) e outros mais novos que já foram premiados em outras edições.

ND: É um critério de selecção adoptado e assumido totalmente pelo festival: quem ganha o prémio num ano é júri no ano seguinte. É um critério que tem as suas potencialidades e as suas fragilidades, e digamos que nesse sentido iríamos provavelmente encontrar sempre, A menos que os autores não tenham publicado durante o último ano. Iriamos sempre encontrar a questão mais complicada do “porque escolhemos aquele?”. Porque foi aquele que foi legitimado, e a nossa legitimação é dada pelo prémio, é uma opção editorial.

BC: A escolha de ser um autor premiado com o PNBD não acaba por ser uma opção fácil por parte da organização para evitar assumir a escolha de um autor em deterimento de outro?

ND: Não, é um critério e não mais do que isso.

BC: Porque é que os PNBD tem cinco júris e os concursos de BD e cartoon têm oito?

ND: Porque os Prémios Nacionais de Banda Desenhada são particularmente mais difíceis de julgar, é preciso ler as bandas desenhadas todas, mais os livros de ilustração, também porque temos alguma dificuldade [em particular] no caso dos editores mais pequenos de nos enviarem os seis exemplares para o júri, e tendo em conta que todo o processo é particularmente mais complexo, é mais eficaz que o júri seja menor. Sendo que por norma um júri deve ser de número impar, três parecia-nos pouco, cinco pareceu-nos adequado, porque consegue representar diferentes espectros e diferentes gostos da banda desenhada em Portugal.

No caso dos concursos de banda desenhada, dos concursos para jovens e pessoas que estão a iniciar a sua carreira, parece-nos que a quantidade de trabalho para fazer a escolha é menor e a diversidade do júri é também mais importante, porque estamos a falar de pessoas que não são conhecidas, de trabalhos que não são conhecidos; essa diversidade de opiniões para nós é importante e por isso temos um júri mais alargado.

BC: Mencionou o envio de seis exemplares para os PNBD, mas o regulamento prevê a nomeação de obras mesmo que não sejam enviados esses seis exemplares.

ND: Exactamente.

BC: Porque é que não existe uma opção clara por um método ou a nomeação pura por parte do júri ou cingindo-se só às obras apresentadas a concurso?

ND: Porque nos parece que é mais rica esta forma, a possibilidade de não só os editores, mas também os autores poderem enviar as suas obras e depois o júri poder complementar com outras obras, sendo que nesse caso, quando um membro do júri apresenta uma obra a concurso é preciso encontrar os outros cinco exempares para que o resto do júri leia esses mesmos livros que não conhecia ainda. É do ponto de vista logístico mais complexo conseguir ter outras obras, mas o júri não é só a direcção do festival, não é só uma das pessoas, e portanto a diversidade quanto a nós traz maior riqueza.

BC: Essa situação de serem necessários mais cinco exemplares adicionais por um júri nomear uma obra já aconteceu?

ND: Aconteceu este ano, em diversas circunstâncias.

BC: Mas existem cirunstâncias em que isso não se verificou e existem prémios que tem três nomeados – como é o caso das tiras humoristicas e dos fanzines – quando existiam obras nessa categoria que poderiam ter sido nomeadas pela qualidade que têm.

ND: Sim, mas o júri entendeu que não tinham ou qualidade ou relevância suficiente para tal acontecer. Portanto foi tomada essa decisão. Há uma excepção relativamente a isso que, apesar de não estar em acta de júri, e que eu posso revelar: A questão do prémio do fanzine.

Vamos ter que re-equacionar totalmente a forma como fazemos essa nomeação. O que é que são os fanzines hoje? É a primeira questão, o que é que cabe ou não dentro desta categoria, ou eventualmente se a categoria de fanzine faz sentido. E em segundo lugar, porque a representatividade da mesma é particularmente difícil, porque muitos dos fanzines se calhar até não têm seis exemplares para mandar. Portanto essa categoria, de facto, tem de ser repensada. Relativamente aos restantes que colocou em concreto, foi uma opção do júri não apresentar mais nenhuma obra.

BC: Tendo em consideração que hoje em dia é possivel ter uma edição de 100 ou 300 exempares com boa qualidade gráfica, o que é que define um fanzine para o AmadoraBD?

ND: A forma que nós entendemos é a forma clássica (que não foi definida por nós) de fanzine, e mais uma vez eu digo que é muito questionável e nós próprios queremos colocar em cima da mesa a redefinição deste prémio. Mas, neste momento, e foi com esse prinicipio que nós fizemos o trabalho, o fanzine é uma edição não regular, que não vai para o mercado de forma regular, não é uma publicação periódica, não tem um canal de distribuição também tradicional, normalmente não é feito por entidades profissionais da edição, não fazem edição de banda desenhada em concreto e, são produzidos de forma mais ou menos artesanal. Repito, obviamente tudo isto hoje é questionável, porque a forma de produção tem muitas possibilidades, mesmo os autores e quem faz a edição têm muitas formas de o fazer com custos relativamente baixos, o que faz com que seja possivel não apenas fotocopiar, que era aquilo que nós conhecíamos dos fanzines – não, há muitas outras formas de fazer fanzines – a difusão… Mesmo grandes livrarias hoje em dia têm exemplares de livros dos quais a tiragem foram, como disse, de 200 ou 300 exemplares. Há multiplas formas de a fazer a distribuição.

Eu repito, nós utilizamos esta metodologia de trabalho, mas consideramos que ela está fora de tempo, tem de ser repensada e no próximo ano certamente vamos utilizar outra metodologia de trabalho.

BC: O facto de existirem categorias com três nomeados e outras com seis não vai ser prejudicial para percepção que o público tem dos prémios, porque numa categoria há três, noutra cinco e noutra seis, não existe uma falta de coerência a nível no número de nomeados?

ND: O número, e é esse número que o júri trabalha, é de cinco nomeados, salvo com duas excepções que utilizamos para cima ou para baixo. No caso de haver menos nomeados isso pode dever-se à não existencia no mercado, falta de candidaturas e de obras alternativas que o júri considere relevantes. Já aconteceu um membro do júri propor um livro e o júri no seu global considerar por maioria, não por unanimidade mas por maioria, que não tinham qualidade suficiente ou relevância suficiente para haver cinco nomeados, portanto, considerar que não há cinco bons, há só três bons que merecem ir a discussão de prémio.

Quando são seis, e o júri faz sempre um esforço grande para escolher sempre cinco, porque é o trabalho do júri, e até já aconteceu serem sete, é porque se quer dar um sinal de qualidade, porque o mercado teve tanta coisa boa – normalmente, o caso mais flagrante é edição de ilustração infantil, tem tanta coisa boa – que é importante que o júri diga que vale a pena colocar um sexto ou até um sétimo livro. Muito raramente, porque queremos dar este sinal que o mercado foi excepcional em termo de qualidade artística.

BC: Existem outros prémios em mercados maiores que o nacional como uma produção superior, como (por exemplo) o cinema com os Óscares, mas existe sempre uma lista de cinco nomeados, a flutuação no número de nomeados nos PNBD não acaba por ser algo que cria a ideia de que os prémios são feitos conforme o júri lhe apetece e não com base num critério?

ND: O júri tem essa responsabilidade, assume-a perante o público e portanto é uma opção e um critério que (havendo a possibilidade no regulamento) o júri exerce de forma responsável. Não o faz se não existir uma relevância efectiva de obras a concurso. Mais uma vez, é um critério que pode ser discutido.

BC: Os prémios não deviam ser repensados para serem mais representativos daquilo que é publicado?

ND: Eventualmente sim, nós estamos a trabalhar nesse sentido. Este ano já fizemos um esforço bastante grande e os próprios jurados foram convidados com bastante antecedência para irem acompanhando o mercado, posso dizer que uma boa parte (não sei dizer exactamente em termos percentuais mas se calhar uns 20%) dos livros que estão nomeados não faziam parte das candidaturas, portanto foi o júri que os foi buscar porque julgou que eram relevantes no mercado português, e disse “eles não se candidataram mas nós vamos apresentar isto”, porque aqui o que é importante… A menos que haja uma recusa total, felizmente nunca aconteceu uma recusa total por parte de um editor ou autor: “nós não queremos sequer participar, não queremos ser nomeados”. Felizmente, isso nunca aconteceu mas aqui o que nos parece importante é que o público que vai à Amadora, o público que nos segue de forma fiel, tenha conhecimento que nós destacamos aqueles livros e isso é que é importante.

Durante o ano, os membros do júri foram recolhendo informação e, repito cerca de 20% dos álbuns que estão nomeados não faziam parte dos candidatos. Isso é uma coisa que estamos a trabalhar nos últimos anos e que não acontecia anteriormente, anteriormente eram só os candidatos e ponto final.

BC: A partir do momento em que essa situação se verifica, não pode fazer com que os editores que enviam álbuns considerem que se calhar não vale a pena enviá-los?

ND: É possível…

BC: A existência desses dois critérios não acaba por ser mais polémico que a existência de um critério único?

ND: É possivel que sim, nós equacionámos várias vezes essa mesma dúvida, porque ela leva invariavelmente a uma desresponsabilização por parte dos editores e dos autores. Mas o que nos pareceu que era primordial era que o público em si tivesse acesso à informação, tivesse acesso aos livros, portanto a opção foi essa. Correndo efectivamente esse risco, é um facto que é intransponível.

BC: Quais foram os critérios para a selecção dos membros do júri?

ND: Os critérios são todos os anos os mesmos: o autor que ganha o prémio no anterior, o comissário da exposição central, que neste caso eram dois [Sara Figueiredo Costa e Luis Salvado] e que correspondia a uma terceira pessoa que era um jornalista e especialista na área da banda desenhada, mas que faça parte do comissariado, e por último…

BC: Mas um comissário jornalista acabou por estar presente.

ND: Sim, o Luís Salvado [da TimeOut], aliás ambos são comissários e ambos são jornalistas, e por último um coleccionador e um amante da banda desenhada que complemente aqui um papel mais de fã, menos de observador constante sobre a banda desenhada. Portanto, esses são os membros do júri que tem sido escolhidos ao longo dos últimos tempos. Para além obviamente da direcção do festival.

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BC: A área comercial do AmadoraBD é representativa do que é a realidade editorial portuguesa?

ND: A área comercial não representa tudo o que é editado em Portugal, mas é representativa na medida em que quem tem interesse em participar neste festival está cá. O mercado não é assim tão grande e as edições também não são assim tantas em termos de banda desenhada.

Felizmente existe uma diversidade e uma quantidade razoável de edições feitas em Portugal, e o que nós tentamos é que entre os editores, que queiram estar presentes e tenham condições para isso, para além de estarem por uma questão comercial estão por uma questão de visibilidade da própria marca, mas para além deles estejam também livreiros que possam representar os outros que não queiram ou não possam estar presentes. Pensamos que é representativo do mercado português, não representa tudo, porque há de facto edições que não estão disponiveis aqui.

BC: Este ano, salvo erro, existe uma “livraria comum”?

ND: Ela sempre existiu, a Dr. Kartoon tem assumido essa responsabilidade (em nome do festival) que é representar editoras que não podem, ou não querem, estar presentes na Amadora.

BC: Os pequenos editores (auto-edição), que está presente em sessões de autógrafos, mas cujas obras estão perdidas numa livraria comum ou num stand de outra editora. A presença desses autores não seria mais benéfica, quer em termos de visibilidade, quer em termo de comercialização dos seus trabalhos se estivessem presentes em algo parecido com um “Artist Alley”, uma tenda de pequenos editores, onde para além de terem a parte de estar a desenhar – às vezes em folhas em branco que as pessoas nem sequer compram as obras – poderem ter uma banca presente com regras diferentes dos editores?

ND: Não tem sido uma questão que nós tenhamos equacionado, mas acho que a sugestão é bem-vinda e podemos de facto equacionar no futuro. Acho que é uma área de trabalho que nós nunca desenvolvemos muito, porque as caracteristicas do festival da Amadora é um festival, ao contrário da maior parte deles, que dura 17 dias e portanto uma actividade dessas teria de ser circunscrita a um ou (no máximo) dois fins-de-semana, mas creio que é uma sugestão particularmente pertinente e que vou equacionar de futuro.

BC: Nas sessões de autógrafos temos um grande número de autores (em particular estrangeiros) sem obra publicada em Portugal, não seria mais benéfico na optica da promoção do livro ter autores com obra editada em Portugal?

ND: Mais uma vez, eu digo que a selecção dos autores começa por sugestões ou dos comissários ou da programação em geral e num trabalho também com os editores, em parceria, são feitos convites e os autores podem aceitar vir ou não vir. Depois, nos nossos critérios, tentamos estabelecer um equilibrio entre os autores que são efectivamente editados em Portugal, ou em português pelo menos, e têm livros aqui em Portugal disponiveis para o público em geral e os autores que também não são muito conhecidos mas têm obra publicada, em linguas às quais os portugueses tem acesso mais ou menos facilitado, como é o ingles, o castelhano ou o francês. Tentamos encontrar esse equilíbrio, porque o festival da Amadora, sendo um festival generalista, tanto quer apresentar os grandes nomes da banda desenhada como quer propor ao público que vem atrás desses grandes nomes outras coisas que eles não conhecem e que poderão vir a ser grandes ou não.

BC: Qual é o grande nome deste ano do AmadoraBD?

ND: Eu diria que é o autor do Batman, claramente.

BC: Quem é que tem a última palavra reativamente à vinda dos autores e como é o processo de decisão, acaba no director do Festival? A vinda dos autores e exposições também está dependente da aprovação da Câmara?

ND: Formalmente, está dependente da decisão da Câmara Municipal, quem faz o convite formal é a Sr.ª presidente da Câmara, quem decide porque tem esse poder legal para poder custear as despesas inerentes a esse convite é também a Sr.ª presidente da Câmara, ou o Sr. vereador do pelouro da cultura que tem delegação de poderes, mas felizmente tem havido um papel de confiança na direcção do festival – porque senão também não seria uma direcção, seria um executante – que faz uma proposta e a proposta é normalmente aceite por parte do executivo da Câmara. Em termos executivos e efectivos é, de facto, a direcção do festival que em limite toma a decisão ainda que ela tenha de ter validade política por parte da Sr.ª presidente da Câmara e por parte do Sr. vereador da cultura.

BC: Existiu este ano alguma tentativa de ter patrocínios para o festival que ajudassem a amortizar os custos ou, mesmo não amortizando, que permitissem libertar verbas para a presença de autores?

ND: Existiu algum trabalho nesse universo mas não existe muito trabalho, a nossa realidade enquanto autarquia coloca-nos questões administrativas, como disse no princípio, particularmente complicadas. A disponibilidade de tempo para trabalhar nos patrocinios é diferente hoje em dia do que era há dez ou 20 anos atrás, quando os patrocinios eram decididos pelas administrações das empresas, muitas vezes por contactos pessoais ou por um mero telefonema conseguia-se resolver as questões. Hoje em dia, as empresas estão organizadas com departamentos de marketing que tomam decisões com grande antecedência e é preciso trabalhar nesse sentido. Para além disso, há 20 anos atrás, há 25 ainda mais, a oferta cultural da cidade de Lisboa e do país em geral era relativamente pequena comparativamente aquilo que é hoje e se falarmos não só da cultura mas do lazer é preciso pensar que em 1994, quando Lisboa foi Capital Europeia da Cultura, tinha acabado de abrir o Centro Cultural de Belém e estavamos em vias da abertura de um centro comercial como o Colombo. A oferta do lazer era particularmente mais diminuta do que hoje em dia, o que quer dizer que ao festival da Amadora se colocam muitos mais concorrentes aos mesmos patrocinadores, logo esse contacto relativamente aos patrocinadores tem de ser um contacto profissionalizado e têm de se seguir determinadas regras que nós não temos tido condições de dar resposta. Preferimos não fazer as coisas do que as fazer mal feitas.

BC: A exposição Galáxia XXI parece ser um bom exemplo de uma exposição que propocionava uma oportunidade de patrocínio quase óbvia, era quase uma questão de escolher qual a marca de tablets para estar presente.

ND: Foi através de um patrocinio que a exposição foi feita, juntamente com a Samsung e Worten. Ambas patrocionaram com os tablets que estão aqui disponíveis e todo o material audiovisual que está no festival é também através da cedência gratuita de uma outra marca, uma loja de electrodomésticos aqui da Amadora.

BC: Mas é um patrocinio em que existe uma cedência de equipamento mas não existe qualquer investimento, aliás nem sequer é possivel ver qual a marca dos tablets porque está tapada e algumas pessoas vão passar por eles e não reparar que são tablets, vão pensar que são páginas que estão em exposição e não um equipamento que pode ser experimentado.

ND: E por isso as contrapartidas que damos são equivalentes à permuta também daquilo que nos é oferecido, que também não é dinheiro nem outras actividades. Como disse não tem sido uma aposta da equipa, porque não temos tido condições de o fazer de forma profissional e competitiva comparativamente a outras pessoas que o fazem bem. Para fazer mal nós preferimos não o fazer e nesse sentido é um trabalho que nós queremos desenvolver de futuro, mas quando o desenvolvermos será de forma correcta. Isto porque neste momento já é possivel de o fazer mas até há dois anos não era possivel do ponto de vista legal, nós não podiamos ter mecenas porque somos uma entidade pública e as entidades públicas que têm mecenas durante três anos não podem comprar mais nada a esse mesmo mecenas: é o que a lei diz, e coloca o mecenas, que foi altruísta, numa situação de desvantagem competitiva relativamente a outrem. Nós não tínhamos condições legais para o fazer. Hoje em dia a legislação do mecenato cultural foi alterada e permite que, no caso excepcional de actividades culturais, os mecenas possam de facto ser concorrentes e serem-lhes comprados serviços noutras circunstâncias.

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04 – A comunicação na sociedade da Informação

BC: Num vídeo promocional do AmadoraBD fala-se da sociedade da informação, mas o AmadoraBD parece ter alguma dificuldade em adaptar-se à sociedade da Informação?

ND: Sim é verdade.

BC: Como é que se justifica que o ABD (ou o CNBDI) não tenha um site que permita a quem está de fora ter acesso a informação sobre o que é feito durante todo a ano na cidade da Amadora, a nível de banda desenhada?

ND: É algo em que estamos a trabalhar mas não tivemos ainda meios para fazer por duas razões. A primeira, do ponto de vista das competências de quem pertence à equipa. Nenhum de nós é especialista em banda desenhada, nenhum de nós segue de forma afincada a banda desenhada, durante todo o ano, e por isso convidamos comissários.

BC: Não estou a falar de a Câmara Municipal da Amadora ter um site informativo sobre BD, estou a falar de um site do AmadoraBD ou do CNBDI onde seja possível ao público consultar informação sobre as actividades e a própria história dessas entidades. O site do AmadoraBD tem um prazo de vida curto, que é de 15 dias, e quem pretender informações sobre as edições anteriores não encontra.

ND: Essas informações existem no site da Câmara Municipal da Amadora, e foi uma opção. Existe dentro do site da Câmara Municipal da Amadora uma parte dedicada ao Centro de Banda Desenhada com as actividades que vão decorrendo, foi uma opção estratégica da comunicação da própria Câmara Municipal da Amadora que decidiu fazê-lo assim e é um assunto ao qual nós, enquanto equipa, até somos alheios. A decisão da Câmara foi concentrar no site da Câmara Municipal da Amadora todas as actividades (culturais ou não) e todos os equipamentos com actividade cultural que tenham informação disponível, nos prazos que o departamento de relações públicas da Câmara assim determina.

O site do festival efectivamente poderia desenvolver esse papel durante o ano, mas a opção da Câmara foi que ele seja um site para cada um dos eventos, cada um dos anos. Por isso é que ele tem esse período de longevidade pequeno. Soma-se a esta questão que podia estar disponível mais cedo, nós gostariamos muito e trabalhamos muito para que isso aconteça, mas infelizmente os constrangimentos legais que nos foram colocados puseram em questão inclusive a sua viabilidade, a possibilidade de ter até o site. Felizmente conseguimos tê-lo, mais tarde do que nós queriamos ter – bastante mais tarde – mas conseguimos tê-lo por isso para nós já foi uma vitória bastante grande, face aos constrangimentos legais que temos.

BC: A Câmara Municipal da Amadora está todos os anos a pagar um site novo, em termos financeiros não acabaria por ser mais benéfico a médio/longo prazo ter um site – que não sendo feito de propósito para cada edição – era um site que era actualizado regularmente, e onde se podia encontrar informação sobre edições passadas e realçar a história que o AmadoraBD tem?

ND: É uma coisa em que estamos a trabalhar, em que não conseguimos dar resposta. Como disse, as instituições públicas são instituições bastante pesadas do ponto de vista burocrático e temos muitas vantagens em fazer o festival no âmbito da Câmara Municipal da Amadora, mas também temos algumas fragilidades. Uma delas é o facto de as instituições públicas – e não só, também instituições privadas – face à sua grande dimensão, terem processos de decisão que levam o seu tempo. A sociedade da informação vive a um ritmo que é outro e essa inadequação da sociedade da informação e da forma de decisão dentro das empresa e instituições, em particular das instituições públicas, leva a que não seja possível ter essa disponibilidade tão concreta. Mas eu repito, é algo que estamos a trabalhar afincadamente de modo a melhorarmos o serviço que prestamos ao público.

BC: Esta é uma questão que não é nova, já tem mais de uma década. Isto não é uma questão de politica de organização e financeira? É que um site em outros moldes podendo ter um custo inicial mais elevado iria compensar a longo prazo em relação ao modelo actual de comprar um site novo cada ano?

ND: São duas questões paralelas, a primeira é que durante o ano essa responsabilidade é uma responsabilidade que a Câmara decidiu que é do gabinete de imprensa e relações públicas da Câmara, nós não temos ninguém neste momento na nossa equipa com competências para fazer esse trabalho. Segunda questão, nós não pagamos um site novo todos os anos, a estrutura do site não a pagamos de novo, nós reutilizamos a estrutura do site, o que nós pagamos é uma nova imagem todos os anos, uma imagem que é renovada e que é característica dos eventos. Os eventos com periodicidade não precisam de imagem de marca que seja diferenciada, o site faz parte dessa comunicação.

BC: A Comic Con de San Diego é um dos maiores eventos de banda desenhada e também agora de cinema e televisão e a imagem de marca do site é todos os anos a mesma com excepção do cartaz.

ND: É uma opção.

BC: Como mantém a estrutura base? Tendo como base os conhecimentos que possuo de webdesign, do modo actual como os sites do ABD são construidos eliminam automaticamente tudo o que existia anteriormente.

ND: Não sei responder tecnicamente, são assuntos que não [domino].

BC: O design é o site novo que mencionava. Quando estamos a falar de um site é disso que estamos a falar, de um site que mantém o mesmo design, o mesmo sistema de gestão de conteúdos, e cuja informação vai sendo actualizada sem eliminar a anterior, algo que poderia ser feito em coordenação com o gabinete de relações públicas da Câmara. É algo diferente de ter um site que muda competamente mantendo só o sistema que gere conteúdos, se é que tem um.

ND: Isso são áreas que não domino, não faço a mínima ideia, nós contratamos pessoas especialistas para fazer esse trabalho e não fazemos a mínima ideia.

BC: Não deveria ter um mínimo de conhecimento para aferir qual é a melhor solução a curto e médio prazo do ponto de vista…

ND: Aqui interessam-me os resultados e os custos para obter esses resultados.

BC: Mas os resultados que o site tem, considera que sejam eficazes?

ND: São eficazes no período em que ele está disponível ao público, poderiam ser muito mais eficazes se ele estivesse disponível muito antes, infelizmente isso não é possivel e não é por falta de empenho e trabalho nosso.

BC: A Presidente da Câmara fez questão de salientar no texto de abertura do catálogo que a BD na Amadora não se limita ao AmadoraBD, não deveria ser encontrado um método mais eficaz de assegurar a comunicação permanente como o público? Não devia ser feito um trabalho de pesquisa de qual o método mais eficaz de ponto de vista prático e financeiro de atingir esse objectivo?

ND: Não só devia como está a ser feito, como percebeu nós estamos com um novo executivo, a Sr.ª presidente da Câmara assumiu funções em Outubro do ano passado, portanto está em funções há um ano. Aliás assumiu funções em termos efectivos em Novembro, houve um trabalho bastante grande em termos de reestruturação de toda a comunicação da Câmara e da marca que a Câmara é em termos nacionais, da imagem que a cidade da Amadora projecta independentemente do festival ou não. Todo esse trabalho já foi feito e é um precurso que se vai fazendo a caminhar. Mas estamos num executivo novo que tem estado a trabalhar esse universo e certamente no próximo ano já teremos resultados maiores relativamente a este ano. Eu não posso responder em nome da Câmara porque não são opções minhas.

BC: Mas está há 15 anos à frente do AmadoraBD.

ND: Relativamente, e repito, a algumas decisões, estas são de ordem executiva da Câmara e há outras questões que são operativas e dependem da possibilidade legal ou não de fazermos determinadas coisas. Quando digo legal digo do ponto de vista logístico, porque, como disse, o código das compras públicas mudou este ano três vezes.

BC: Estamos a falar de uma questão estratégica de comunicação do próprio festival, que devendo estar em sintonia com o executivo da Câmara Municipal da Amadora, é uma política de comunicação do Festival?

ND: E como disse e muito bem, não está a ter todos os resultados que podia ter, não está a ser totalmente eficaz e é algo em que nós estamos a trabalhar para melhorar efectivamente.

BC: Porque é que este ano não houve tema?

ND: Existe um tema, o tema é a exposição central Galáxia XXI, e o tema proposto é a reflexão em torno do que é a banda desenhada contemporânea, o que é hoje a banda desenhada, o que é que ela poderá ser no futuro. Esse foi o tema de trabalho, não foi trabalhado enquanto marca em termos de comunicação porque havia um outro factor que era também bastante importante para nós e que é em si mesmo o motivo por que decidimos avançar com esta reflexão sobre o que é a banda desenhada hoje, que são os 25 anos, o facto de o festival em si enquanto evento cultural fazer 25 anos e que é um marco a nível nacional, não só na banda desenhada, que é também marca a nível internacional, são poucos os eventos que tem tanta longevidade, existem alguns felizmente, mas no sector cultural português existem poucos eventos que tenham uma regularidade ou uma longevidade tão grande.

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