Amadora BD Na Intersecção Da BD E Da Política

Um ensaio sobre a orientação “ideológica” do AmadoraBD, o papel que o estado deve ter na promoção da arte, o uso que é dado a fundos públicos.
Este é um dos artigos mais longos que já foram publicados aqui no aCalopsia, mas tendo em conta a matéria em discussão considerei que era mais prático a sua publicação na integra ao invés de o dividir em diversos artigos mais curtos. Deste modo é possível uma visão global sobre os vários aspectos das questões que são abordadas.  Motivo pelo qual algumas questões abordadas em artigos anteriores voltam a surgir, devidamente enquadradas no contexto global. Recomendo aos leitores, sejam eles regulares ou novos, que se sentem e apreciem a viagem. Espero que me desculpem pela pela escrita mais elaborada e por alguma terminologia mais “académica”, contudo como este artigo me vai granjear mais uma dúzia de novos inimigos, no mínimo, resolvi dar vazão à minha veia literária e conquistá-los com estilo. Este artigo pode ser considerado como um rascunho de uma história oculta da BD portuguesa, aquela que muitos conhecem mas poucos comentam, onde se tenta desmistificar alguns dos maiores mitos e mentiras que são contadas à quase três décadas. Isto não é pessoal, é política! Existe uma tendência neste país para se confundir a esfera pública e profissional com a privada. Algo que se torna mais patente no seio de comunidades em que o conceito de “professional” é, na maioria das vezes,  mero eufemismo. É o caso da banda desenhada onde a generalidade dos intervenientes é amadora ou na, melhor das hipótese, trabalha em part-time. Existem algumas situações. alguns textos publicados no aCalopsia foram encarados como sendo motivados por questões pessoais. Na realidade surgiram devido a questões que apelido de “ideológicas”, à falta de melhor termo. Este artigo em particular, tal como o título o indica, é sobre politica, porque é na intersecção da cultura e da política que se define o que é o mercado, a sobrevivência e subsistência dos autores, em particular em países como Portugal. O que está em causa nos PNBD não são só os prémios, é também a orientação “ideológica” do AmadoraBD, o papel que o estado deve ter na promoção da arte, o uso que é dado a fundos públicos e aquilo que se pretende para a banda desenhada portuguesa a curto, médio e longo prazo. Nada disto é uma questão pessoal. É tudo uma questão política que tem a sua génese na última década do século XX. Convém analisar o passado, porque agora, tal como aconteceu anteriormente, volta a ter papel preponderante no desenvolvimento do mercado um agente político: Carla Tavares, Presidente da Câmara Municipal da Amadora. Responsável pela manutenção ou remoção de Nelson Dona como director do AmadoraBD, sendo que este já deu provas de ser incapaz de gerir com competência um evento que em outros tempos prestigiou a cidade e o concelho que lhe deu o nome. Portugal é um país com 10 milhões de habitantes, mas só uma pequena minoria é composta por leitores de banda desenhada, o que torna um mercado que já de si seria pequeno em algo mais diminuto.- Essa circunstância transforma o Estado – directamente ou através do poder local – num factor determinante no desenvolvimento do mercado da cultura, duas palavras que são muitas vezes apresentadas como sendo antónimos quando. na realidade. é na sua conjungação que é possível a existência de uma cultura dinâmica que potencia a qualidade dos autores, projectando o seu trabalho em território nacional e além fronteiras. Sem mercado, a cultura fica limitada às benesses estatais, sejam elas directas ou indirectas, as quais são atribuídas através daqueles que o Estado escolhe para distribuir os fundos do erário público, por vezes segundo critérios dúbios e questionáveis. Esta é uma realidade que já se verificou e continua a subsistir porque, qual ouroborous, a BD portuguesa parece ser uma serpente que se devora a si mesma, sem que as lições do passado sejam apreendidas, onde o que foi volta a ser, porque os problemas fundamentais não são resolvidos, sendo raramente abordados e muitas vezes ignorados. Contudo, antes de se abordar o contexto histórico que conduziu ao presente em que vivemos, convém começar pela ponta do icebergue, os PNBD. O que está em causa não são só os prémios, mas uma dialéctica bafienta da qual os PNBD se transformaram este ano na face mais visível. O bom nome dos intervenientes Algumas pessoas consideraram que ao considerar que Conefrey e Venâncio são melhores que Sousa Lobo e Baeza estava a denegrir os vencedores dos PNBD. Contudo, os prémios especificam que se destinam a premiar o Melhor álbum, o Melhor Argumento e o Melhor DesenhoOs motivos que me levam a dizer que uns são melhores que os outros são devidos a questões técnicas advindas da  avaliação da qualidade do trabalho, e serão desenvolvidas num artigo futuro, uma vez que este artigo é sobre política e não sobre crítica artística. Agora existem outras questões mais prementes para desenvolver. Quando se contesta o mérito da atribuição de um prémio é por se considerar que um autor é melhor que os restantes, sendo que neste caso quem foi realmente denegrido foram os autores que, possuindo qualidade, não foram sequer nomeados. Contudo, como parecem existir pessoas que não compreendem o motivo porque existem prémios e qual o objectivo da atribuição dos mesmo, tentarei esclarecer esse aspecto e comentarei também o direito ao bom nome que, pelo menos do meu ponto de vista, parece ser um  direito que só assiste a alguns. Porque há várias décadas que existem autores a serem denegridos publicamente sem que isso cause celeuma. A Honra dos Autores Nélson Dona e Pedro Moura – os principais responsáveis pelo que sucedeu nos PNBD –  beneficiaram os vencedores. Esta afirmação não devia ser polémica, contudo como existe quem considere que pela minha lógica “se eles optassem por escolher o Venâncio e o Conefrey não estariam a fazer outra coisa a não ser beneficiar os autores”, convém esclarecer que esse raciocínio está correcto e errado em simultâneo, porque parece ignorar alguns facto que deviam ser elementares.  Primeiro: O principal problema nos PNBD está em  Nélson Dona os ter transformado quase na única forma como os autores nacionais podem ser expostos no AmadoraBD, como já foi previamente explicado. Isso dá aos prémios uma importância que de outro não modo teriam, e afecta a promoção, divulgação e crescimento do mercado da BD nacional. Segundo:  Os autores são sempre benfeciados quando recebem prémios, essa é a sua definição e objectivo: destacar e realçar os autores premiados. Ao contrário de outros prémios, os PNBD não dão nenhuma recompensa monetária directa aos autores, contudo existem benefícios indirectos, incluindo no próprio festival. O vencedor do prémio de melhor álbum, para além de ter direito a uma exposição, é o autor em destaque e autor da ilustração do cartaz do ano seguinte, sendo remunerado por esse trabalho, o que acaba por ser um benefício financeiro indirecto. Os restantes vencedores nas principais categorias nacionais têm direito a uma exposição individual, algo que ajuda sempre a vender mais alguns exemplares, sendo por isso um benefício financeiro indirecto. Terceiro: é suposto que os prémios sejam atríbuidos com o máximo de isenção e imparcialidade, segundo critérios uniformes e com base em critérios de qualidade, não é suposto serem  atribuídos com base no gosto pessoal, a menos que sejam prémios de fãs. O júri beneficiar autores não é polémico, porque é para isso que existem os prémios, o que pode causar polémica é o motivo porque alguns jurados beneficiam alguns autores. Quando se discute o mérito de nomeações e vencedores é normal falar de quem é o melhor, tendo como base uma avaliação qualitativa do trabalho. O que não deveria ser normal é as nomeações e os vencedores serem justificados por serem as obras de que o júri gosta mais. Como é obvio, caso Ricardo Venâncio e/ou Diniz Conefrey tivessem sido vencedores eles teriam sido beneficiados pelo júri, contudo, eu sou da opinião de eles que merecem ser distinguidos devido à qualidade do seu trabalho e não ao meu gosto pessoal. São dois autores com  estilos distintos, um que eu aprecio o outro não. Contudo isto parece ser uma indiosacracia que só eu possuo, tenho capacidade de distinguir entre gosto pessoal e avaliação qualitativa. Existirão sempre critérios subjetivos na avaliação da arte, contudo,  quando o que está em causa é avaliar quem é o melhor autor, naqueles que é suposto serem os prémios mais prestigiados da BD portuguesa, deve existir sempre uma base qualitativa objetiva, a qual deve servir de referência e que é suposto sobrepor-se ao gosto pessoal. Caso intuíto seja atribuir prémios com base no gosto pessoal de alguns elementos do júri, então deviam mudar o nome dos PNBD para Prémios do Nelson Dona & Amigos. Este anos os prémio são polémicos porque os  responsáveis pela situação) se esqueceram de Diniz Conefrey, o que me providencia uma excelente oportunidade para demonstrar como a bedófilia, a conversa dos patos sem cuecas e dos heróis de collants é só conversa para entreter tolos. No final o que conta não é mesmo a Arte, é a presunção e água benta com que se untaram uns privilegiados que consideram o seu gosto superior ao da ralé. A conversa do “alternativo vs comercial” em Portugal só serve para não se falar do essencial: como criar um mercado, como remunerar os autores de modo que possam ter liberdade financeira para criar. Duplo prejuízo Existe uma situação que já mencionei anteriormente e que vou voltar a frisar, posso estar a ser um pouco repetitivo, mas é um pormenor que parece que só eu é que reparei e que creio ter consequências graves para a promoção dos autores nacionais de qualidade, para além de impedir um crescimento do mercado de um modo mais sustentado. Os PNBD foram transformados na única maneira de os autores nacionais terem uma exposição individual no núcleo central do festival, salvo algumas raras excepções que só servem para confirmar a regra. Esta opção cobarde que Dona utiliza para gerir a área expositiva do festival tem efeitos nefastos para  editores, autores e visitantes .É uma opção que limita a diversidade em termos de exposições, impede  autores e editores de exibirem trabalhos com qualidade porque não foram premiados, algo que os impede de potenciar lançamentos, o que limita o crescimento do mercado. Tomemos como exemplo Hanuram: A Fúria, de Ricardo Venâncio. Este ano não teve uma exposição porque era uma novidade e não terá no próximo ano porque não ganhou um prémio. Como é óbvio, uma exposição potência as vendas de um álbum, sendo que no caso de Hanuram podia ser um factor decisivo para se transformar num caso de sucesso. O álbum de Venâncio é verdadeiramente alternativo no contexto da BD portuguesa, pela temática e pelo estilo de desenho, é um trabalho que possuí caracteristicas  que podem atrair um publico mais vasto que o habitual. Em particular se uns milhares de pessoas fossem apreciar a arte original por esta estar em exposição. As exposições são um elemento que contribui para a projecção de projectos e autores. O modo como elas são actualmente seleccionadas no AmadoraBD  é o pior modelo possível, porque este não serve para potênciar o crescimento do mercado e a valorização do talento nacional. Pior, ainda por cima essa selecção de exposições é feita segundo o presuposto  que estão em exibição os melhores autores nacionais, o que nem sempre é verdade. Basta ter em conta que este ano Conefrey e Venâncio não estavam sequer nomeados, e autores como Sousa Lobo e Baeza não são mesmo os melhores autores que foram publicados em 2016/17. Para além disso, quem tem conhecimento de como funcionam os prémios tem noção da falta de critério que existe na forma como Nelson Dona  “organiza” o juri e conduz as nomeações. Este ano a incompetência e falta de critério era visiveis na lista de nomeações e nem era necessário existirem confirmações para se compreender o que sucedeu. Existem motivos para que várias pessoas tenham recusado convites para integrar o júri dos PNBD ao longo dos anos, do mesmo modo que outros que dele fizeram parte juram nunca mais lá voltar, pelo menos enquanto o seu presidente for o actual director do festival. Estes são alguns dos factores pelos quais o AmadoraBD vive cada vez mais desligado do mercado, ignorando aquilo que de bom é feito a nível da edição de autores estrangeiros e, em particular, de autores nacionais. Convém relembrar que o número de obras nacionais a serem editadas em países estrangeiros tem vindo a aumentar, do mesmo modo que existe um número crescente de autores portugueses a trabalharem para editoras estrangeiras, incluíndo em grandes editoras como a Marvel e DC Comics. Ao invés de reflectir esta realidade, o festival só mostra uma visão limitada da BD, completamente anacrónica e virada para o passado. Isto devido aos três pilares que Dona Incompetência erigiu na Amadora,  os quais são suportados e defendidos por pessoas como Costa Moura na sua defesa incansável da arte chiliana. Dentro de algumas linhas será dissecado de modo mais profundo este  conceito “chiliano”, mas antes convém abordar os elementos que definem essa criatura sincrética apelidada de Costa Moura, o seu bom nome e o respeito que merecem da comunidade. A Honra de Costa Moura Algumas pessoas podem considerar que o termo “Costa Moura” é um trocadilho jocoso, contudo ele tem um propósito mais nobre: a despersonalização de Sara Figueiredo Costa e Pedro Moura. Não quero negar-lhes a individualidade que possuem, contudo o que está aqui em causa não é quem eles são enquanto individuos, num âmbito social, mas quem eles são no âmbito da banda desenhada, das posições e ideologias que defendem e promovem em forúns publicos, no âmbitos das atividades onde ao longo de mais de uma década têm sido protagonistas. Porque foram impulsionadores e dinamizadores de diversos projectos, actividades e exposições, para além de outras actividades remuneradas ou não que visam a promoção da banda desenhada enquanto forma de arte. Âmbitos onde têm tido posições e opções que são públicas e podem ser analisadas e avaliadas por qualquer pessoa. A criação do sincrético ser denominado Costa Moura, permite que o leitor compreenda que o que está aqui em causa são ideias, preconceitos e outras caracteristicas que tem caracterizado o pensamento de ambos, que podendo ter algumas divergências possui muitas similiaridades, sendo em alguns casos idêntico. O termo também incluí outras personalidades que partilham do mesmo pensamento, porque o que está em causa não é o individuo mas o pensamento chiliano. Estando devidamente enquadrado o contexto em que surge Costa Moura vou agora explorar um de semântica que é de extrema importância, porque algumas pessoas não compreenderam o que tem estado a ser questionado, como demonstra este comentário de Filipe Melo, o argumentista de obras como Os Vampiros. A Sara Figueiredo Costa é das pessoas mais íntegras e competentes que tenho o prazer de conhecer. A decadência do festival tem a ver apenas com as decisões absurdas da direcção, e a completa falta de noção do director. Relativamente às responsabilidades do director, concordo que ele é o principal responsável, contudo existem outras pessoas com responsabilidades como é o caso do executivo camarário da Amadora e alguns colaboradores do evento. Antes de se abordar com mais detalhe essa situação, convém desambiguar a questão semântica. Eu coloquei a negrito os termos que parecem estar a causar celeuma: integridade e competência, contudo não é bem disso que eu tenho estado a falar no caso de Costa ou Moura. No caso do Pedro Moura eu até estive para lhe atribuir um prémio de subversão, porque ele até pode fazer traduções de material da Marvel mas no final vota na Baeza, ninguém pode negar que o chili lhe corre nas veias. Não creio que existem dúvidas que é uma pessoa integra e fiel aos seu principios chilianos. E esse é o problema: a parcialidade que todos conhecem. O que está a ser questionado, relativamente a Costa Moura não é a sua integridade mas a parcialidade que o caracteriza, algo que ninguém  nega porque é conhecida à décadas. O que está em causa é as pessoas confundirem gosto pessoal com qualidade, em particular em casos em que lhes compete  realizar uma avaliaçao que deveria basear-se em critérios qualitativos isentos e uniformes, quer seja na questão da atribuição de prémios ou na redacção de críticas. Apesar de não ter qualquer problema em reconhecer a integridade e competência de Costa Moura para promover e divulgar a BD que se encaixa no seu gosto pessoal,  não creio que tenha competência para promover a BD num âmbito mais vasto, porque o que as últimas décadas demonstram é que tem por hábito ignorar tudo o que não encaixe dentro do nicho chiliano, um termo que inventei para caracterizar o subgrupo de BD que lhe agrada. Apesar de utilizar terminologia como independente e alternativo a realidade é que o sincrético Costa Moura só tem olhos para uma vertente desses movimentos, seja a nível nacional ou internacional. Esta parcialidade pelo espiríto chiliano está presente em todo o pensamento dos Costas Mouras deste Portugal, sendo um dos motivos porque se respira um ar bafiento na Amadora e o mercado tem problemas em evoluir e potencializar o talento que existe. Nem todos os amigos são iguais Antes de prosseguir com o desenvolvimento da questão chiliana quero esclarecer um termo que parece ter criado algumas confusões: amigos, uma palavra simples mas que por vezes tem significados distintos. Num país pequeno como Portugal, num universo reduzido como o da BD nacional, a maioria das pessoas conhecem-se todas. Devido a esse facto existem os amigos da BD, os quais na sua maioria são só conhecidos com quem nos cruzamos em eventos ou nas redes sociais, pessoas com interagimos só contexto da BD. Depois existem pessoas que são de facto amigos, uma vez que para além da BD existem outros elos de afinidade. Por fim temos os amigos, é um grupo mais restrito de pessoas, porque para além de afinidade pessoal, devido a diversas caracteristicas dos individuos, existe também uma afinidade de gosto e estilo. Apesar de todas as pessoas no mundo da BD gostarem de BD, nem todos gostam do mesmo tipo de BD, por isso é evidente que existe sempre uma maior identificação com quem partilha os mesmos gostos. Não é preciso invocar motivos menos nobres para explicar o facto de algumas amizades existirem por questões estilísticas,  devido à partilha de um gosto comum por um estilo, o qual encaixa numa definição pré-estabelecida de de qualidade que é feita não com base na qualidade intrínseca do trabalho mas no gosto pessoal do individuo. No fundo, são amizades partidárias. O Problema Francisco Para aprofundar um pouco esta questão podemos usar como exemplo Pedro Moura, o qual no âmbito da sua longa carreira como divulgador, crítico, dirigente associativo, promotor de eventos e pedagogo já deu amplas mostras de ser um chiliano ferrenho. Moura até pode ser a ser amigo ou colaborador, em alguns projectos,  de autores daquela escola que costuma ser denegrida com o adjetivo de “comercial”, e até pode  reconhecer  que possuem qualidade dentro daquele estilo, mas no fim do dia o seu coração vai sempre preferir uma Baeza e a essência chiliana. Basta relembrar que no âmbito do program Futuro Próximo, na Fundação Calouste Glubenkian, realizou-se um clico dedicado à  Banda Desenhada, Literatura Policial e Ficção Científica,  o qual contou com a edição de O Problema Francisco, escrito e ilustrado por Francisco Sousa Lobo, no âmbito do ciclo dedicado à BD coordenado por Pedro Moura. Ficaram de fora autores como Jorge Coelho, Filipe Andrade Ricardo Cabral, Miguel Mendonça, André Lima Araújo e tantos outros que têm a capacidade para criar mundos fantásticos e capturar a imaginação dos leitores. Estes projectos remunerados por entidades publicas ou privadas, costumam ser organizados por indivíduos que excluem autores que possuem talento para desenvolver e, em alguns casos, até desenvolvem  trabalhos dentro policial ou fantástico, mesmo em situações que esse dois géneros também são divulgados, motivo pelo qual seriam os autores mais indicados para o projecto. Mas como em Portugal imperam outros valores, no Futuro Próximo, ao invés de policial, história de fantasia ou ficção-científica o público foi contemplado com “um ensaio autobiográfico”. Para além da questão da remuneração, estes eventos são também uma oportunidade de exibir arte de autores nacionais. No âmbito destas conferências, por exemplo, esteve presente Lauren Beukes, argumentista de Fairest: The Hidden Kingdom, um spin-off de Fables editado pela Vertigo. São eventos que também poderiam ajudar à internacionalização dos autores, para além de serem sempre uma maneira de promover a banda desenhada junto de outros públicos.
O mesmo sucede em outros eventos que Moura organiza, porque ele é um dos partidários do chili, um apreciador da cultura chiliana. No fundo esta questão dos amigos acaba por ser também ela uma questão política, porque um dos melhores exemplos para se compreender a destrinça entre amigos e amigos é utilizando uma analogia político-partidária. Imaginem um casal, funcional, apaixonado, num bom relacionamento mas em que ele é do CDS e ela da CDU. Devido a esse facto partilham uma vida e são felizes mas, na hora de votar, ele vota sempre no CDS e ela CDU. No fundo é o que sucede com Moura e outros partidários do chili, independentemente das amizades no fim votam sempre chili, porque consideram a arte chiliana superior ou, talvez, considerem que é uma afirmação da sua superioridade intelectual e gosto requintado, embora muitas vezes seja só o reflexo de um complexo de superioridade que ignora a inexistência de qualquer valor real da obra. Como é óbvio o termo “chiliano” deriva da associação Chili Com Carne mas, convém esclarecer, não é uma boca ao Marcos Farrajota, é uma forma de distinguir aquilo que são os movimentos independentes e alternativos a nível internacional e mesmo nacional, e a visão redutora que algumas pessoas têm dos mesmos. Porque efectivamente existe um pensamento chiliano que tem sido promovido à décadas, embora este não tenha surgido de um movimento orgânico de autores, mas devido à intervenção de agentes estatais que condicionaram a evolução do mercado, à semelhança do que aconteceu em outras artes em Portugal. Este termo vai ser mais aprofundado de seguida, porque a verdade é que apesar de três décadas de dialética independista que é suposto valorizar o alternativo, a realidade é que em Portugal foi esquecido um facto essencial nesses movimentos no contexto internacioanal: a remuneração dos autores, porque o objectivo final costuma ser encontrar métodos alternativos que permitam aos autores conceber e editar banda desenhada, com liberdade criativa e independência quer do grande capital quer do poder estatal, sendo remunerados de modo a garantirem a sua subsistência. O conceito chiliano de independente ou alternativo é uma conceito que é muito português e, por vezes, é aplicado em situações que são o oposto daquilo que as palavras significam quer no dicionário quer no contexto da BD internacional. O único motivo porque existe e persiste é  porque nesta nação quem menos ordena são os autores. O oposto de Chiliano O pulsar do movimento chiliano tem como base uma “preocupação alternativa”. Para se compreender como diverge dos movimentos internacionais, ignora os autores de qualidade que inovam, aqueles que trilham novos caminhos e fazendo a BD pulsar com criatividade em outros continentes, convém dissecar um pouco o conceito de “independente/alternativo” que vem sido impingido em Portugal pelos Costas Mouras deste país. De modo a permitir um melhor enquadramento desta inovação portuguesa, no contexto internacional, vou abordar a opinião de Moura relativamente a Paul Pope, a qual é o reflexo do pensamento dominante no meio chiliano, sendo até partilhado por pessoas que o abominam. Contudo, é um conceito que é redutor e esteve sempre desenquadrado da realidade nacional e internacional. A característica de se ser “alternativo” [em Paul Pope] não reside na sua expressão idiossincrática nem nas suas pulsões intrínsecas, mas somente nas estratégias de produção e distribuição.! Sendo estes os motivos que impedem Moura de ver “Pope como um verdadeiro artista com uma preocupação ‘alternativa’.” Como Paul Pope é um autor inédito em Portugal, deixem-me fazer uma curta síntese biográfica do autor para compreenderem a sua importância, no contexto internacional. Começando a carreira no final da década de 90 com a auto-edição dos álbuns Sin Titulo em 1993 e The Ballad of Doctor Richardson em 1994, a edição da série THB em 1995 cimentou Pope como uma das vozes mais singulares do final da década de 90 da BD norte-americana. O seu trabalho despertou o interesse do gigante editorial japonês Kodansha, o qual convidou Pope a integrar o grupo de autores ocidentais – onde se incluíam nomes como Jon J. Muth e Baudoin – que foram contratado para um projecto editorial que visava diversificar a linha editorial da editora, mas que acabou por se desvanecer sem grande sucesso. Foram poucas as obras desenvolvidas que chegaram a ser concluídas ou publicadas. Uma das excepções foi A Viagemde Edmond Baudoin editado em Portugal pela Levoir na colecção Novela Gráfica. O estilo gráfico de Pope tem com influência inicial o trabalho de Hugo Pratt, mas vai adicionando progressivamente diversas e dispares influências como  Daniel Torres, Bruno Premiani, Jack Kirby, Alex Toth, Tony Salmons ou Silvio Cadelo. O seu trabalho no Japão acaba por influenciar o seu trabalho a nível narrativo, devido ás diferenças existentes entre a BD japonesa e a Ocidental, devido à estrutura narrativa e não às questões estilísticas que existem no mangá. Edmond Boudoin,  um dos grandes nomes da BD independente e alternativa franco-belga, frisou de um modo sucinto as diferenças narrativas existentes entre o seu trabalho para o mercado ocidental e oriental. Nas suas  histórias “muitas vezes existem vinhetas em que a imagem diz uma determinada coisa, o texto diz outra e há ainda um bocado de texto em voz off, que simboliza o narrador da história. Isto é, três diferentes níveis de leitura na mesma imagem.” Esta é uma abordagem que no Japão “é impossível, tal como não é aconselhável utilizar balões de pensamento, ou aqueles pequenos textos a dizer ’entretanto’, ‘enquanto isso’, ou ‘no dia seguinte’. Em contrapartida, temos um espaço muito maior para desenvolver o jogo corporal das personagens. E, mais do que pelos diálogos, a caracterização das personagens faz-se através desse jogo corporal, dos olhares, dos sorrisos.” Contudo como Baudoin afirma,  “é uma forma mais visual de contar uma história, mas tão ou mais eficaz do que a nossa!” No trabalho de Paul Pope existe uma simbiose perfeita do melhor que existe em termos de narrativa gráfica da escolas americana, japonesa e franco-belga.  Esta simbiose transformou Pope num dos autores mais influências da sua geração, sendo também um representante daquilo que é a quintinsessência de um autor independente, alternativo e com uma voz autoral. Apesar de ter realizado alguns trabalhos esparços para Marvel e DC Comics – para a qual realizou Batman: Year 100, obra premiada com dois prémio Eisner – Paul Pope iniciou a sua carreira auto-publicando-se através da sua chancela editorial, Horse Press, na qual explorou os temas e formatos que quis, não se limitando a realizar obras para o tradicional formato de comic book. Para além de grandes editoras Pope também colaborou em algumas das antologias independentes norte-americanas de referência como a Dark Horse Presents e Negative Burn. Apesar de ter começado por se auto-publicar através da Horse Press, foi sempre desenvolvendo projectos para outra editoras que lhe davam a liberdade criativa que pretendia, tendo sido editado por Dark Horse, Legendary, Vertigo, Oni Press e Adhouse Books. O seu mais recente trabalho, Battling Boy, foi editado pela 01: Second Books (First Second), uma chancela editorial da Roaring Brook Press (ex- Macmillan Publishers) e parte do grupo Holtzbrinck Publishing Group, uma empresa alemã que é uma das cinco maiories editoras em lingua inglesa. A First Second é aquilo que os norte-americanos chamam de editora boutique, especializada em publicar um número restrito de autores selecionados- No caso desta,inclui para além de Pope nomes como Lewis Trondheim, Eddie Campbell, Joann Sfar, Gene Luen Yang, Nick Abadzis, Gipi ou  Cyril Pedrosa. Pode, por isto, ser considerada como uma editora independendente de prestígio apesar de estar inserida num grande grupo editorial “Iindependente” não é o oposto de comercial em mercados como o norte-americano, onde existem autores independentes que são comerciais e vendem. Obras claramente independentes como Maus e Palestine estão entre os livros de BD mais vendidos. Bone de Jeff Smith, um dos êxitos da BD independente norte-americana é actuamente editado pela Scholastic Corporation, uma multinacional norte-americana que é a editora de títulos como Harry Potter ou Hunger Games. Contudo, Jeff Smith continua a auto-editar, através da Cartoon Books, os seus projectos mais recentes como Rasl e Tüki: Save the Humans. O complexo autoral Paul Pope é um dos autores que possui uma voz autoral inconfundível porque, independentemente da editora que publica o seu trabalho, Pope é sempre Pope, mantém-se fiel ao estilo que o caracteriza, sem fazer cedências estilísticas e explorando as temáticas que lhe interessam, algo que deverá ser visível de novo quando for editado La Chica Bionica, projecto concebido para o mercado franco-belga onde será editado pela Dargaud. Em Portugal existe uma corrupção chiliana de determinados termos que é simplesmente absurda. É algo que aconteceu com conceitos como “independente”, “alternativo” e “autoral”, os quais passaram de adjectivos descritivos para se transformarem em adjectivos qualitativos ao quais se associa um determinado género, como o “ensaio biográfico”. Convém salientar que existem trabalhos autorais bons e maus, ao contrario do que alguns pensam, do mesmo modo existem trabalhos autorais que exploram temáticas como ficção-científica, terror ou fantasia porque são esses os interesses dos autores. Ccomo, por exemplo, no  caso de Alejandro Jodorowosky, o autor chileno cuja voz autoral se revelou no reino da fantasia e ficção científica, carácter que não é posto  causa por ter sido realizador de filmes avant-garde, validado por artistas como Marcel Marceau e Salvador Dali e foi um dos nomes de proa da Metal Hurlant, a qual foi uma revista de BD revolucionária  em França e cuja influência se estendeu aos Estados Unidos. Paul Pope é um autor com uma voz autoral única e foi em muitos aspectos, tal como Mike Allred (Madman),  um dos percursores dos autores alternativos da actualidade que rejeitam o  “pensamento alternativo” do sec. XX, aquele que surgiu na década de 80 nos EUA, se popularizou na década de 90 e deixou de ser original à duas décadas. No fundo, são autores alternativos que exploram temáticas distintas das dos seus predecessores, não se deixando prender pelas imposições das editoras comerciais ou pela ortodoxia alternativa. É uma nova geração de autores como Brandon Graham, Brian Lee O’Malley, James Stakoe ou Paul Maybury, entre outros, onde também pontuam nomes como Dean Haspiel, autor que colaborou com algumas lendas do undergroud como Harvey Pekar, em The Drifter (editado pela Vertigo), e foi um dos fundadores do colectivo digital Act-I-Vate, o qual publica banda desenhada de alguns autores conhecidos  e jovens promessas como Haspiel ou Chip Zdarsky, desenhista que está actualmente a ilustrar Criminosos do Sexo, série com argumento de Matt Fraction editada pela Image, publicada em Portugal pela Devir. Um dos projectos mais recentes de Haspiel é Red Hook, parte da linha New Brooklyn desenvolvida como projecto online para a Webtoons. Esta linha inclui a série The Purple Heart escrita por Vito Delsante e ilustrada por Ricardo Venâncio. Este pequeno aparte serviu para demonstrar como Hanuram está mais próximo do zeitgeist da banda desenhada independente  norte-americana, do que autores que se dedicam ao estilo chiliano que foi original no final do séc. XX. Red Hook por Dean Haspiel Esta corrente do movimento alternativo nem é particularmente recente, basta ter em conta que obras como Groo de Sérgio Aragonés, Grendel de Matt Wagner, Scout de Tim Truman, Elfquest de Wendi e Richard Pini, Cerebus de Dave Sim, The Crow de James O’Barr e Teenage Mutant Ninja Turtles de Peter Laird e Kevin Eastman também são obras de referência na BD alternativa norte-americana, a qual nunca se restringiu à limitada visão chiliana que existe do termo. Como é óbvio, os autores que eu mencionei, até os mais veteranos, não possuem o tal “pensamento alternativo”, “ expressão idiossincrática” ou  “pulsões intrínsecas” que reflectem as preocupações do século passado, expressas nas obras editadas pela Fantagraphics e Drawn & Quartely na década de 90, algo que acaba por se reflectir no festival da Amadora a nível de exposições e nos convidados de Sara Figueiredo Costa. Contudo, esse é um tópico que será desenvolvido em maior detalhe dentro de alguns parágrafos. Antes disso, convém ir à génese desta visão míope da BD que, apesar de eu apelidar de chiliana, não tem a sua origem na editora-associativa de Marcos mas no seu mestre. O Profeta Cotrim Já mencionei que isto é uma questão politica. Convém realçar agora como os decisores políticos foram instrumentais para criar aquilo que é a actual banda desenhada portuguesa, em particular o papel do filho do falecido Mário Soares:  João Soares, Ministro da Cultura República Portuguesa em 2015/2016, cargo do qual se demitiu após a polémica gerada por ter ameaçado dar “um par de bofetadas” em dois cronistas do jornal Público, por terem criticado a gestão do seu ministério. Contudo, não é devido a esse cargo ministrial que João Soares é uma figura incontornável na história da banda desenhada portuguesa, esse facto deve-se aos cargos camarários que exerceu na na viragem do século. Não creio ser um exagero constatar que João Soares foi um dos políticos que mais se destacou na promoção da banda desenhada como forma de arte, enquanto vereador da cultura da Câmara Municipal de Lisboa (entre 1990 e 1995) apoiou alguns projectos como a LX Comics, editada por Renato Abreu e João Paulo Cotrim, e que publicava autores como Nuno Saraiva, Fernando Relvas, Filipe Abranches, Pedro Burgos e Diniz Conefrey. Em 1995, Jorge Sampaio é eleito presidente da República e demite-se do cargo de presidente da Câmara de Lisboa, cargo que foi assumido por João Soares. Enquanto presidente da edilidade liboeta João Soares cria em 1996 a Bedeteca de Lisboa (actual biblioteca dos Olivais) convidando João Paulo Cotrim para ser o seu director. Entre os vários projectos que desenvolveu à frente dessa entidade encontra-se a recuperação por Cotrim da LX Comics como uma colecção de BD, a qual teve como um dos seus coordenadores Marcos Farrajota, o qual até então se tinha destacado como editor do fanzine Mesinha de Cabeceira,  e passou a desempenhar também o cargo de bibliotecário na dita Bedeteca. Para além da colecção LX Comics a Bedeteca também edita outras edições de BD, a solo ou em co-edição, sejam álbuns ou revistas como a segunda série da Quadrado, um projecto que surgiu como evulução do fanzine Epitáfio e foi uma tentativa de realizar uma revista de BD portuguesa. Não encontrou o sucesso esperado mas foi recuperado por Cotrim, tendo-se transformado num dos projectos que serviu para divulgar crítica e ensaio dentro da parcialidade chiliana. A Bedeteca também foi responsável por projectos de historiagrafia como é o caso dos Cadernos da Bedeteca, no âmbito dos quais é editado Os Comics em Portugal. Uma história da banda desenhada, de António Dias de Deus, e no qual este escriba tem direito a um curto parágrafo, é caso para dizer que já faço parte desta história há décadas, porque também consto num Dicionário de Autores Portugueses de Banda Desenhada…. Não olhem para mim, a culpa é do Leonardo de Sá, ele é que me colocou lá! Após este breve interlúdio pessoal, regressamos à relevância da Bedeteca, a qual também organizou o Salão de BD de Lisboa, onde Cotrim foi percursor da fusão da BD e ilustração em eventos de banda desenhada. Basta ter em atenção que o título oficial do evento era Salão Lisboa Ilustração e Banda Desenhada, tendo sido organizado também um salão dedicado só à ilustração, para além de a Bedeteca ter publicado catálogos de ilustração portuguesa. A Bedeteca de Lisboa foi um colosso na viragem do século, dispondo de fundos que pareciam ilimitados, contudo em 2002 João Paulo Cotrim demite-se, constando que os dias de financiamento “ilimitado” tinham terminado e aquele equipamento iria sofrer alguns cortes. Rosa Bareto assumiu o cargo de directora da Bedeteca após a demissão de Cotrim. Em 2005 Pedro Santana Lopes lidera uma lista do PSD à Câmara Municipal que, contra todas as sondagens, derrota a lista do PS liderada por João Soares. Os cortes no orçamento da Bedeteca prosseguiram e nem o regresso do PS à liderança do município lisboeta impediram o fim da sangria, em 2010 o executivo da Câmara de Lisboa, liderado por António Costa encerrou as actividades paralelas que a Bedeteca organizava. Actualmente a Bedeteca já nem existe como organismo independente, foi transformado num serviço da Biblioteca Municipal do Olivais, o seu site desapareceu e o domínio bedeteca.com redirecciona para a loja Mundo Fantasma. A única memória daquilo que foi um dia a poderosa Bedeteca de Lisboa é o blogue Uma Bedeteca Anónima, mantida pelo pouco anónimo Marcos Farrajota, umas das poucas heranças que Cotrim deixou de um reinado de seis anos, onde dispôs de financiamento para promover a BD como poucos, ao longo da história da banda desenhada nacional. A direcção de Cotrim na Bedeteca de Lisboa foi marcante e caracterizou-se por uma abordagem muito “francesa” do apoio e papel do Estado na divulgação da cultura, privilegiou a “arte”, ignorando qualquer coisa que tivesse aparência de “comercial”, isto apesar de não existir BD comercial portuguesa. Em 1996, foi editado só um álbum de autores nacionais em Portugal, a BD Portuguesa tinha como único baluarte os fanzines, onde existiam autores com estilos muitos distintos, mas que devido à circunstância de serem amadores a editarem fanzines eram por definição “independentes” e “alternativos”, dois termos que viriam a tornar-se populares nas décadas seguintes. Ideologia Cotrim Apesar de Pedro Moura considerar João Paulo Cotrim o autor de “algumas obras maiores da banda desenhada contemporânea portuguesa”, a verdade é que o motivo porque foi determinante na evolução do mercado nacional de BD deve-se ao dinheiro de que dispôs enquanto director da Bedeteca, foi o elemento que lhe permitiu implementar uma visão estratégica para o que pretendia para a BD nacional, a qual não encontra equivalente em congéneres estrangeiros porque advém de uma linguagem da Belas Artes e não de uma resposta a problemas do mercado, porque para os problemas que existiam nunca apresentou nenhuma solução viável. A sua concepção de BD encontra-se visível nas páginas da LX Comics e das opções que tomou enquanto director da Bedeteca, onde privilegiou autores que “insistem no experimentalismo que tenta oferecer em linguagem de massas, como é a BD, uma cultura de proposta”. A ênfase em experimentalismo é minha, porque efectivamente essa tem sido a grande característica da BD nacional na últimas décadas, tendo os intervenientes esquecido que o experimentalismo é um meio e não um fim em si mesmo. Mas, foi critério “experimental” que, em parte, define o trabalho de Cotrim enquanto editor e gestor de fundos: uma preocupação com a “cultura” e a “arte” num contexto como ela é entendida no discurso das Belas Artes mas, na maior parte das vezes, desligado da realidade da BD nacional e internacional. A visão de Cotrim não era predominante ao final do século XX. Em Vanguardismo na BD: Quem és e para onde vais!? um artigo contemporâneo da LX Comics, publicado em 1992 no fanzine Café No Park, Fernando Vieiraquestiona alguns dos caminhos que então eram sugeridos e que se iram prevalecer nas décadas seguintes. A contestação do vanguardismo experimentalista desvaneceu-se quando a Bedeteca se transformou num colosso que, para além do serviço de biblioteca, era uma editora de BD, editora de literatura ideológica sobre o disfarce de crítica e promotora de grandes eventos. O confronto entre o independente e o comercial foi curto e a vitória retumbante. A suposta guerra terminou em 1996 quando João Paulo Cotrim entrou pelas portas da Bedeteca. O Massacre Comercial Tenho de reconhecer que estou a dar demasiado mérito a Cotrim. Sinceramente não sei o que é o suposto “comercial” de que todos falam.Na década de 90 do século XX não existiam revistas ou editoras em Portugal, com pouquíssimas excepções e as quais foram na maioria dos casos de fogo fátuo. Para além disso o público de BD português nunca foi tão brega como alguns gostam de insinuar, basta lembrar que autores como Bilal, Hugo Pratt, Moebius, Jodorwosky, Comés, Miguelanxo Prado, Boucq ou Bourgeon estavam editados na integra ou quase na década de 90. Em Portugal sempre existiu uma oferta diversificada de estilos, embora a BD mais comercial fosse a franco-belga linha clara. Existem muitos autores que não encontraram público porque nunca foram aposta dos editores, os mesmos que são os culpados pela predominância da BD histórico-didáctica nas décadas de 80/90. Contudo, nem esse tipo de BD estava já em voga no final do século XX, onde utilizar o termo mercado era um grande eufemismo para aquilo que existia, a Meribérica/Liber e a Asa, quando editavam. A edição a nível de álbum era parca, o único verdadeiro sucesso comercial da BD portuguesa era Jim Del Mónaco, o qual encaixando visualmente dentro da  linha clara franco-belga, em particular nos primeiros álbuns, tematicamente era uma paródia da mesma e destinada a um público mais adulto. Fora dos álbuns, autores como Fernado Relvas e Nuno Saraiva encontraram espaço nos jornais para desenvolver uma banda desenhada que entra dentro dos canônes do “independente”, ou não fossem eles dois dos autores da LX Comics original. No final da década de 90 há muito que tinha deixado de existir uma escola de BD portuguesa, se é que algum dia tal existiu. Desde o surgimento da revista Visão na década de 70 que as grandes influências dos autores nacionais são externas, filtradas pelo gosto próprio e desenvolvidas num estilo próprio, completamente distinto dos restantes autores nacionais. O grande elo unificador era o formato de publicação: fanzines, os quais existiam para todos os gostos e feitios. São eles que vão alimentar parcialmente a revolução efectuada pela Bedeteca e pela Polvo. Refiro parcialmente porque a revolução deixou de fora os autores “comerciais”, nomes como Jorge Coelho, Pedro Potier, Miguel Montenegro, Miguel Jorge ou Eliseu Gouveia, para mencionar alguns dos sobreviventes dessa “escola” que ainda não abandoram a produção e edição de BD, mas feita quase em exclusivo para o mercado norte-americano ou, em alguns casos, para o mercado nacional mas à margem do circuito comercial e alternativo. No início do século XXI o mainstream da BD portuguesa era efectivamente a BD independente, como dira José Carlos Fernandes. Convém relembrar que mainstream é um termo inglês que significa “corrente principal”, a qual varia de país para país. A BD franco-belga linha clara nunca foi mainstream nos EUA, só para dar um exemplo. Esta longa dissertação serviu para constataro óbvio, algo que todos sabemos, só foi necessária realizá-la porque ainda se continua a perpetuar a mentira de que existe um combate entre alternativo e comercial, quando não existe uma BD portuguesa que seja assumidamente comercial, e as poucas que merecem esse título são obras tão distintas como A Pior Banda do Mundo e Dog Mendozza e Pizzaboy. Contudo, apesar de o independente se ter transformado no mainstream nacional, a verdade é que o tópico mais relevante dos movimentos independentes internacionais continua a estar ausente do dialéctica chiliana nacional: a remuneração dos autores, a distribuição e comercialização de modo a permitir uma produção regular e, voltando a repetir-me, remunerada. A ausência desta questão explica-se, em parte, devido à maioria do debate ser realizado pelo crítico, o funcionário público ou o dirigente associativo,  tendo como base um conceito de abstracto de “arte” onde se desvalorizam e até se criticam aspecto mundanos como o facto de os autores necessitarem de dinheiro para comer. Como nunca foi um movimento de autores mas de críticos, o mercado e os problemas que o afectam estão ausentes da retórica chiliana. Foi criado um conceito abstracto, posteriormente são seleccionados autores para serem editados como representantes de um movimentos, esquecendo aqueles não encaixavam nesse conceito e nos critérios estilísticos propostos, ou por outros motivos. No blog Os Positivos refere-se que os autores nacionais, os tais supostamente independentes e alternativos, “submetem a sua liberdade criativa trocando autonomia por auditoria (pública).” Estão parcialmente correctos. Convém relembrar que na década de 90 em outros tempos existiam poucas alternativas, para além dos fanzines, para os autores que pretendiam editar. Actualmente já é possível considerar a opção de emigrar, mas em 1996 ainda vivíamos num mundo em que era dito que os autores nacionais nunca iriam singrar no mercado internacional. Por isso, como as opções são poucas, e os autores são quem menos ordena, foi promovido o conceito de “arte” que o crítico gosta e o mercado transformado no vilão. Mas existiu alguma complacência dos autores. A Infantilidade do Mercado O autor que faz arte pelo amor à arte sem se preocupar com o vil metal é um conceito muito poético e giro, para quem não é autor. Contudo, até os autores se transformarem em plantas capazes de se alimentarem por processos de fotossíntese, vivam num mundo pós-capitalista  ou, melhor ainda.  não necessitem de casa, luz ou adquirir materiais para a execução da sua arte, toda a conversa que ignora a sua remuneração não visa a sua real independência mas a manutenção do status quo de dependentes das benesses estatais, condenados a fazer BD em part-time,  a emigrar ou então dedicarem-se a outras áreas como a ilustração infantil. Uma das ironias deste Portugal é que por um lado critica-se a BD de cariz infantil, como as edições da Disney publicadas pela Goody, mas depois condena-se os ilustradores a fazerem livros infantis e trabalhos comerciais porque não se podem dedicar à sua arte. Contudo, o lado “positivo” desta ironia muito portuguesa é que os autores são todos “artistas de cariz autoral”, basta dar uma vista de olhos pela secção de livros infantis de ilustradores portugueses para se aferir como o “alternativo é o mainstream”.,Todos os estilos de arte publicados derivam do famoso conceito de “arte”, parecendo por vezes que os livros são mais direccionados aos adultos que apreciam “arte” do que a ser histórias e desenhos que agradem aos miúdos. Salvo raras excepções, está ausente da edição de livros infantis traços que possam ter qualquer resquicio de “arte comercial”. Esta é outra das ironias portuguesas: num mercado onde a corrente principal é a “arte” quem tem um traço que não se enquadra nesse estilo necessita de modificar a sua forma de arte, senão emigra ou dedica-se à pesca. Contudo, apesar do mainstream ( leia-se: corrente dominante na produção nacional) ser o suposto alternativo, não deixa de ser vendida a ideia de que existe uma guerra entre alternativos e comerciais. Se ela existe é ao nivel da produção interna vs produção externa, onde a nacional sai sempre derrotada  em virtude de ser um produto designado a agradar a um pequeno nicho artístico, ao invés de ser concebida para um público mais vasto, acabando por ficar dempre reduziada ao tal público alvo para o quaul é produzida. Convém salientar que do mesmo modo que existem cânones dentro dos sistemas “comerciais”, estes também existem ao nível da produção “alternativa”. Em ambos os caso é cerceada a liberdade autoral mesmo quando é suposto ser valorizado o cariz autoral de um trabalho porque, como diria Pedro Moura, é preciso ser-se um “artista com uma preocupação alternativa. Derivado à preocupação alternativa que assola as mentes das pseudo-elites vigentes a evolução do mercado transformou-se numa questão política, porque é necessários questionar o uso que deve ser dado aos fundos que se destinam à promoção da dita arte. Sobre os malefícios da “arte comercial”, a malevolência inerente aos sistemas capitalistas e etc e tal, já todos fomos devidamente avisados, sendo tópico de conversa constante. Contudo, parece que a generalidade desconhece que é nos mercados mais competitivos que existe uma maior produção de autores alternativos. É nestes mercados que os autores conseguem realmente ser independentes dos decisores comerciais, estatais ou críticos. Ao invés, num mercado pequeno como o Português, os autores acabam por ser quem menos ordena, quem tem menos poder ficando, dependentes do estado, seja no poder central ou no camarário. O qual, como já foi referido, foi elemento fundamental no desenvolvimento do mercado da BD nacional, moldando a produção de autores nacionais de acordo com uma ideologia pré-determinada e assumida, alheia aos interesses do público, à diversidade criativa e aos interesses dos próprios autores. Num mercado pequeno em que a produção se encontra limitada a pequenas editoras com pouco capital para investir, eventos municipais como o AmadoraBD são fundamentais para potencializar o trabalhos dos autores e editores. Mastambém podem ser um obstáculo que impede o seu desenvolvimento, caso seja tomada a opção de utilizar meio milhão de euros para promover aquilo que só meia dúzia aprecia. As culpas de Costa Moura O AmadoraBD foi outrora denominado de comercial, porque era o maior evento nacional dedicado à banda desenhada, aquele onde estavam presentes alguns dos maiores nomes da BD internacional. Ao longo dos último anos isso tem vindo a mudar, contudo, as culpas não são só do director. Costa Moura  são coniventes com a corrupção do espírito do festival, sendo alguns casos os agentes subversivos que conluem para levar o evento na direcção do passado, talvez num sonho de reviver os dias de glória da Bedeteca de Lisboa e dos seus eventos, onde foram colaboradores. Esta subversão do conceito de um festival generalista virado para o grande público num evento que talvez pretenda ser mais “artistico”, para não lhe chamar elitista, tem os resultados que estão à vista: um festival desligado do Mercado e dos seus intevenientes (público, editoras, autores), centrado numa experiência muselógica bafienta, datada e muitas vezes anacrónica. A presença de autores independentes/alternativos não é um problema se for um contributo para um festival diversificado, contudo não é isso que se tem vindo a verificar.  Para além da parcialidade a nível de programação que o caracteriza, Costa Moura também é responsável pela validação crítico-artistica do irrelevante, das opções que servem para disfarçar o patente desinvestimento no festival, sem que exista uma desorçamentação do mesmo. Porque apesar de não constar que tenha existido uma redução do orçamento, há vários anos que o número indicado é o de 500 mil euros, a verdade é que todos os visitantes podem constatar que o festival está cada vez mais pobre. Os convidados irrelevantes Costa Moura têm também responsabilidade no que sucede no festival. Existem situações que são opções do director, mas são validadas pelos críticos-comissários. O conceito até pode não ser da sua autoria, mas são eles que o implementam e defendem, por isso não podemos esquecer a sua conivência. Um dos exemplos são os convidados irrelevantes de Sara Figueiredo Costa, no âmbito da exposição central. Algo que eu tenho já mencionado e ainda voltarei a mencionar, porque é um dos problemas fulcrais do festival. Existindo uma contenção nas despesas, com autores estrangeiros, é incompreensível a vinda de autores sem obra publicada em território nacional,  porque estão editados em português alguns dos maiores nomes da BD internacional e vários dos valores emergentes. Os autores desconhecidos não contribuem para dinamizar o mercado nacional, ou para promover os livros editados, servem só para promover a visão que a comissária tem sobre uma tema no contexto da banda desenhada, transformando no ponto central do festival não uma obra ou autor, mas a visão de um comissário. O facto é que Sara Figueired0 Costa, comissária de duas das exposições centrais dos últimos quatro anos, parece incapaz tal como os restantes comissários, de explicar ao director que o carácter pedagógico da exposição não se perde devido à ausência de convidados no âmbito dessa exposição. É uma questão de gestão de fundos, a qual é uma decisão do director, mas que conta com a conivência dos seus comissários, os quais também não parecem possuir a capacidade de realizar ou propor exposições centrais com autores editados em Portugal, nem de convidar autores representativos de novas correntes. O que temos no final é autores desconhecidos dos quais todos já se esqueceram antes deles chegarem. É um desperdicio de dinheiro A Bedeteca do AmadoraBD A exposição de livros, cujo nome oficial é Exposição do Ano Editorial, é uma das coisas mais absurdas que já se lembraram de realizar no festival e contou com a validação crítica do seu valor museológico, primeiro, por Sara Figueiredo Costa e posteriormente por Pedro Moura, comissários dessas exposições e que escreveram sobre os “méritos” da mesma.
Tendo em conta que ambos já foram (e Moura ainda é) membros dos corpos dirigentes da Associação Oficina do Cego, estando por isso envolvidos no mundo associativo que visa promover a edição e trabalhos de autores nacionais, não podiam ter dito ao director que existem melhores maneiras de aproveitar o espaço? Como uma feira de autores nacionais ou exposições de trabalhos de autores nacionais. Os custos adicionais que essas opções implicavam não eram elevados, os autores nacionais não são pagos por cederem pranchas para exibição. No caso de autores estrangeiros existem situações em que é necessário pagar o seguro das obras devido ao elevado valor que possuem. Existiam opções para ocupar aquele espaço que seriam benéficas para o mercado, para os autores e mais interessantes para os vistantes. Se a responsabilidade é de Dona, Costa Moura não deixa de ser conivente, mesmo que tenha alguma crítica ao facto de se realiar uma exposição de livros num evento que tem uma feira de editores e tem actividades paralelas numa bedeteca. A verdade é que no final validam uma experiência museológica que não traz qualquer mais valia para o evento. Pode ser que colaborem por convicção,  acreditando que são dois aspecto positivos no festival, podeem colaborar  devido ao ordenado que lhes é pago ou pode ser porque a sua colaboração lhes permite promover a arte chiliana: a sua visão parcial e limitada de BD. Em qualquer dos casos não deixam de ser conivente e partilha as culpas com o director. Existem outros comissários que também são coniventes, ao colaborarem e validarem os pilares de Dona Incompetência, contudo no caso de Costa Moura a situação é mais grave devido ao facto de ser um chiliano convicto que partilham uma visão da BD muito limitada e elistista.  Convem não esquecer o mérito que este sincrético ser teve na hérculea  tarefa de levar Marcos Farrajota, sua associação (Chili Com Carne) e a sua editora (Mmmnnnrrrrg) para o festival. O casamento de Marcos e Nélson Personagem menor mas fulcral nesta história, Marcos Farrajota é um velho conhecido dos nosso leitores regulares. Para benefício dos recém chegados vou contextualizar a sua relevância nesta narrativa, mesmo que isso implique repetir dados que já são do conhecimento da maioria. Para começar, convém desmitificar uma mentira que de tantas vezes repetida é aceite como realidade: a Chili Com Carne não foi uma editora relevante no viragem do século, a única relevância que teve deriva do Marcos Farrajota ser “editor” da colecção LX Comics, editada pela Bedeteca onde era e é funcionário. A única relevância que se pode atribuir à Chili Com Carne  (CCC) é enquanto promotora de eventos como a Feira Laica, a qual foi organizada entre 2003 e 2006 no recinto da Bedeteca. Agora chegamos aquela parte em que é necessário relembrar que a CCC não é uma editora, é uma associação sem-fins-lucrativos que se dedica às lucrativas actividades de edição e comercialização de livros. Em tempos ainda organizou outras actividades, como exposições e feiras como a já mencionada Feira Laica, mas isso foi num passado cada vez mais distante e actualmente a principal e diria única actividade é a edição de livros. Marcos Farrajota é o aparente presidente vitalício da dita associação, a qual faz co-edições com outras editoras como a Mmmnnnrrg, propriedade de Marcos Farrajota, a qual não me recordo de ter editado um livro que não fosse em co-edição com Associação a que o editor da Mmmnnnrrg  preside, a qual foi fundada em 1995 e “oficializada” em 1997. A associação Chili Com Carne não é um projecto editorial que visa a promoção da BD mas do conceito chiliano de “arte” porque, como indica o manual, “a Associação Chili Com Carne tem tanto interesse pela Banda Desenhada como um cão pelo Reagan”. Para além disso é um projecto anti-capitalista, anti-mercado. É  esse o meu grande problema com o Marcos e a sua associação. Eu não sou apologista do capitalismo selvagem, mas sou realista e tenho consciência num mundo capitalista, sem existir um mercado de BD não é possível remunerar os autores pelo trabalho que realizam. Tudo o que a dialéctica anti-capitalista e anti-mercado conseguiu nos 22 anos em que a CCC existe foi continuar a não remunerar os autores, pelo menos condignamente, porque os autores recebem  500 paus ou nem isso, contribuiu para estropiar um circuito independente, o qual era débil mas ficou pior após se transformar num circuito chiliano. Não faço a mínima ideia se existe alguma ilegalidade no modo como a Chili Com Carne é gerida, eticamente existem coisas reprováveis, mas o problema fulcral não é esse. O problema é que a Chili é vendida por alguns como sendo “independente” e “alternativa” quando não representa nada disso, para além de ajudar a denegrir editoras que o são de facto. Existem pessoa, entre as quais se incluí o presidente da associação, que consideram que outras pequenas editoras são “inferiores” porque são editoras “comerciais”, precisam de ter lucro para investir e recuperar o capital investido. Contudo esquecem-se que a Chili, devido ao facto de ser legalmente uma associação. tem vantagens competitivas relativamente a outras pequenas editoras: quotas de sócio e subsídios. Como tem uma centena de sócios e quotas de 10€m, isso significa que, se os sócios pagarem as cotas, tem todos os anos mil euros de capital a entrar para investir. Para além disso existem tem outra fonte de receita nos subsídios do Instituto Português de Desporto e Juventude. Por isso, a Chili Com Carne tem uma vantagem competitiva sobre as outras pequenas editoras, as quais não possuem estas injecções de capital anuais que permitem sempre editar novos projectos, mesmo que os antigos não vendam. Essa vantagem competitiva só é problemática porque em vez de ser usada para promover o mercado de BD nacional, é usada para o inverso: denegrir os autores ou editores com o apelido de comercial quando, como Paul Pope, não passam no teste de pureza chiliana que avalia o pensamento alternativo. Também convém não esquecer que na dialéctica chiliana o mercado é o inimigo, e o Presidente da Associação é um anti-capitalista convicto que não quer ser confundido com um porco capitalista. Marcos Farrajota é tão anti-capitalista e anti-mercado que nem queria ir para o AmadoraBD, só lá foi devido à pressão de Costa Moura e graças ao prémio que, segundo consta, se deve à campanha de Sara Figueiredo Costa para que fosse premiada uma antologia com o prémio de melhor álbum. Zona de Desconforto Não tenham dúvidas,  Marcos Farrajota não queria ir à Amadora, fazia parte da sua imagem de freak de esquerda, rebelde anti-sistema e anti-capitalista. O AmadoraBD não fechou as portas à CCC ou aos seus autores, o presidente da associação é que não queria lá estar, oficialmente. Apesar da CCC e a editora do presidente só terem tido uma presença oficial no festival após a Zona de Desconforto ter sido premiada, existiu sempre uma presença oficiosa. Durante anos as edições da CCC e da editora do presidente estiveram oficiosamente presentes no stand de outras editoras ou lojista no evento, era uma maneira de assegurar que vendia alguns exemplares no festival sem ter uma ligação oficial ao mesmo, até existiam lançamentos piratas durante o festival. Edições que eram feitas para serem lançadas durante o festival, contudo os lançamentos e apresentações oficiais eram feitos em eventos anti-capitalista, actos de resistência ao comercialismo do AmadoraBD que permitiam ter novidades à venda no festival na mesma. A presença da CCC no AmadoraBD não é novidade, já acontecia antes. A novidade é estar agora presente oficialmente, porque recebeu um prémio, caso contrário era capaz de continuar a estar presente oficiosamente. Eu era mesmo para dizer que durante os anos em que CCC não teve uma presença oficial isso foi prejudicial para os seus autores, uma vez que lançamentos e sessões de autógrafos ajudam sempre a aumentar as vendas. Contudo, as vendas são irrelevantes para a Chili, que não se revê como uma editora comercial. O Marcos é tão anti-comercial que transformou a exposição da Zona de Desconforto no AmadoraBD numa exposição de Lisbon is very tipical, uma antologia de autores estrangeiros, remetendo os autores portugueses (os que tinham sido premiados) para o fundo da exposição. Caso não tenham compreendido: uma exposição que existiu devido a uma antologia ter ganho um prémio de melhor álbum nacional, foi utilizada para promover uma antologia de autores estrangeiros. Não se preocupem, que isto não é nada de anormal no AmadoraBD. O facto de a CCC ganhar prémios não era um problema, caso os prémios fossem atribuídos por mérito, algo já chegou a acontecer com Nunsky. O que os torna problemáticos é serem o reflexo da chilificação do festival, o qual está cada vez mais de costas viradas para o mercado e para o público, para além de ter sido obtidos graças ao nepotismo da politica de filhos e enteados institucionalizada por Nelson Dona  nas normas dos prémios. O festival cada vez mais parece uma versão rasca do Salão de Lisboa, mas existe quem aprecie isso, como é o caso do anónimo biliotecário que já elogiou esta regressão porque considera que é “um festival que melhora pouco a pouco”, uma opinião que não é partilhada por muitos. Na Central Comics existe uma avaliação que é mais correcta, na minha opinião, sobre a edição deste ano. De um ponto de vista “leigo”, de uma visitante não profissional, não é difícil seleccionar este Amadora BD 2017 como a menos entusiasmante dos últimos (pelo menos) quinze anos. O mundo dos quinhentos O AmadoraBD transformou-se no mundo dos quinhentos: 500 exemplares de tiragem, 500 paus para os autores se tiverem sorte e 500 mil euros para o festival que os promover. Tiragens de 500 exemplares não é coisas rara em Portugal, contudo existe algo que distingue a Chili Com Carne das outras editoras comerciais, é que elas fazem reedições e a Chili não. Quando uma editora é pequena, o capital é pouco, a única maneira de crescer é fazer reedição em cima de reedição, é assim o mercado cresce, os autores recebem mais e no próximo álbum já começam com uma tiragem superior. Contudo isso é o que fazem as editoras comerciais, a Chili é uma associação e não se rege pelos princípios do neoliberalismo. Isto é uma questão política e ideológica. Toda a dialéctica chiliana de merda sobre bedófilia, comercial e afins só serve para não se falar da remuneração dos autores, aquele é o grande problema da banda desenhada nacional. O que era necessário discutir, aquilo que deveria ser a preocupação no debate sobre a BD nacional, deveria ser o seguinte:
    1. Métodos de edição que permitem a remuneração dos autores;
      1. Distribuição, como ultrapassar as limitações existente no mercado;
      1. Exportação de obras, algo que já acontece de modo esparso,  mas ainda não acontece com regularidade suficiente para permitir uma remuneração ou produção regular.
        1. Divulgação mais eficaz do material publicado.
Contudo, em vez disso anda-se num discurso que só revela hipocrisia ou um grave problema de dissonância cognitiva. Porque em Portugal o problema da BD comercial é a sua ausência, o alternativo é a corrente dominante e pessoas como Nelson Dona, Marcos Farrajota, Sara Ferreira Costa e Pedro Moura é que são O Sistema, que não se resume a eles, mas não existe qualquer dúvida de que são dos rostos mais visíveis. É um sistema chiliano que anda sempre com a arte na ponta da língua, mas não sabe distinguir o que é arte de fezes, confundindo por vezes as duas. É um sistema que vive de costas voltas para o mercado porque tem acesso aos fundos do estado, que  vai pagando contas. Dona e Farrajota são literalmente alimentados pelo sistema, porque são ambos funcionários públicos. O que não é nada de mau em si, os funcionário públicos são necessários quando servem o bem público, contudo, existem alguns que dão mau nome à classe devido à sua incompetência e porque, em alguns casos, estão mais interessados em se servir do bem público do que em servir o público. As Tetas do Sistema Existe um sistema que impede ou, no mínimo, faz tudo  o que está ao seu alcance para evitar a existência de um mercado. Curiosamente, é composto por malta que anda sempre com o punk na ponta da língua mas devem sofrer de dislexia, o slogan que surge na literatura é “fuck the system” mas eles leram “suck the system”, o que apesar de ser similar não é o mesmo. Quero desde já salientar que não reprovo o acto de mamar em si, é algo inato nos seres humanos enquanto mamíferos, perfeitamente natural em crianças em idade de amamentação, nos adultos deveria era ficar restringindo às actividades lúdicas num âmbito consensual e preferencialmente em privado. Embora a legitimidade de adultos poderem mamar em público seja um tópico intrigante para debater noutros fóruns e noutro contexto, pode gerar um debate interessante e causar alguma polémica. Agora não creio que exista polémica quando se reprova o acto de mamar no bem público,  a res publica: o termo em latim para a coisa pública, aquela a quem muito gostam de fazer belos fellatios, deixando-a murcha e  incapaz de se voltar a erguer. Por vezes, esgota-se o sémen do erário público. Nelson Dona parece determinado em transformar o AmadoraBD em mais uma teta para os eleitos dos sistema mamarem, enquanto Carla Tavares e o executivo camarário sorriem para a fotografia, na inauguração de um evento que se transformou num verdadeiro festival da incompetência do seu director. Para quem ficar ofendido com a linguagem utilizada nas linhas anteriores, ou considere que o seu conteúdo é difamatório, devo salientar que ele é meramente metafórico. Quando se reduz um evento a uma visão limitada de um universo vasto, como é a banda desenhada, ignorando a maioria dos intervenientes, não tendo sequer a vantagem apresentar novas correntes ou tendências, aquilo que se está a instituir é efectivamente  um festival de amigos para amigos, os tais que partilham um “pensamento” que apesar de se cognominar de “alternativo” se quer único, devido à superioridade intelectual que não possui quem o promove, alheio a qualquer relevância cultural, para além da visão míope dos promotores do dito evento. O Grande Irresponsável Um festival como o AmadoraBD é um esforço colectivo, motivo pelo qual a responsabilidade pelo que sucede é partilhada por muitas pessoas,  como Costa Moura e dos decisores politicos que aprovam o caos organizativo que se tem verificado. Afinal, é da responsabilidade de Carla Tavares, presidente da edilidade, zelar pela boa gestão dos fundos que disponibiliza para o evento.
Contudo, apesar de ser um exímio mestre na arte de sacudir a àgua do capote, é óbvio que que o grande responsável pelo que acontece  no AmadoraBD é Nelson Dona. É director-geral na altura de colher os benefícios, pelo que deve também ser responsabilizado quando as coisas não correm bem. Mas, em Portugal, a culpa tem o hábito de morrer solteira e os incompetentes caem para cima. Existem problemas crónicos que se sucedem no festival cujas causas só podem ser atribuídas a incompetência, uma vez que existem soluções para os resolver, quando as pessoas o desejam e têm capacidade para as implementar.  Num evento que existe há 28 anos, não deviam verificar-se falhas como uma exposição não estar pronta no dia de abertura, , em particular quando o director é alguém que tem feito parte da organização desde o início e exerce o cargo há 18 anos. É uma questão que já foi abordada, mas merece ser desenvolvida. O arquitecto do festival Nelson Dona nasceu em 1970 em Luanda.- Chegou à Amadora com seis anos, depois de poucos meses a residir em Lisboa- Formou-se em Arquitectura pela Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa contudo, como diz o Correio da Manhã, “nunca chegou a projectar edifícios”. Enquanto universitário, Nelson Dona começou a trabalhar como assistente na Galeria de Arte da Câmara Municipal da Amadora, local onde se realizou o 1º Salão de Banda Desenhada da Amadora, evento que hoje é conhecido como AmadoraBD, O arquitecto Nelson Dona colabora na organização deste primeiro Salão. Um evento que, , como o próprio indicou em entrevista ao  Espalha Factos, “não era para se repetir, mas a exposição, realizada na Galeria Municipal de Arte, teve tantos visitantes, como no resto do ano as outras exposições todas, que a Câmara Municipal da Amadora percebeu que existia interesse público na actividade.” Em 1991 o evento muda-se para a Associação Académica da Amadora e, no ano seguinte, surge finalmente o Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora, onde o arquitecto continua a colaborar como director de arte até ser promovido. A terceira edição do evento marca o início do FIBDA, deixando boas memórias e  estabelecendo o modelo que deu projecção nacional e internacional ao festival: exposições de grandes autores e a presença dos mesmos na Amadora. Nesse ano  Morris,o criador de Lucky Luke, o qual já tinha estado presente na primeira edição, regressou e também estiveram presentes Miguelanxo Prado e Jean Graton (o criador de Michel Vaillant) entre outros autores. Foi esta a matriz que foi seguida no festival durante anos. Luis Vargas, após uma década como director geral do festival, é substituído em 2000 por Nelson Dona, o qual começa a implementar os três pilares que têm caracterizado o reinado do arquitecto: PNBD, efemérides e a exposição temática que é suposto ser o tema estruturante do festival. Em 2009, no ano em que o evento celebrou o vigésimo aniversário, houveuma mudança da imagem de marca do evento. Passou de FIBDA para AmadoraBD, nome que  tem sido abreviado, por aqui, como ABD. Incluído nessa mudança esteve a alteração do logotípo do evento, realizada pelo GBNT, gabinete de design de Vasco Ferraz, Manuel Chichorro e Paula Dona, o qual foi responsável durante largos anos pelo projecto gráfico do festival, para além de ter concebido a nova imagem de marca do Município da Amadora em 2014, ano em que também assina o projecto gráfico da Bedeteca da Amadora.
Quando foi promovido a director-geral do AmadoraBD, Nelson Dona realizou uma pós-graduação em Gestão Cultural. Algo que poderá ter tido efeitos mais negativos que positivos, uma vez que ao longo destes 17 anos tem existido um maior preocupação com a “cultura” e a “arte” do que com a parte popular, o festival. O conceito implementado pelo arquitecto parte de preocupações museológicas e museográficas, mas esquece que um museu e um festival são duas coisas distintas. Nenhum é melhor do que o outro, contudo são situações diferentes que se devem reger por preocupações distintas para alcançarem os objectivos a que se propõem. Dona Incompetência O Amadora BD é um evento em que existem muitas pessoas responsáveis, provavelmente é capaz até de padecer de um excesso de protagonistas, contudo a responsabilidade maior é do director-geral do evento, o qual faz parte da organização desde o início.Mas, nestes 18 anos em que ocupou o cargo mais distinto no evento,  não revelou competência para corrigir os problemas crónicos que o afligem. Revelou sim foi uma capacidade singular para sobreviver no xadrez político-partidário do município da Amadora, demonstrando capacidade para gerir as vaidades pessoais e jogos de interesse que um evento com um orçamento de meio-milhão de euros desperta. Efectivamente, na Amadora este director parece ser alguém cujo trabalho é apreciado, uma vez que a Câmara Municipal da Amadora ”ampliou”, em 2015, os poderes do arquitecto no festival com a extinção do CNBDI (Centro Nacional de Banda Desenhada e Imagem). Fundado em 2000, o CNBDI foi um serviço da Camâra Municipal da Amadora que durante quinze anos promoveu actividades relacionadas com a BD, fora do período do festival, e era “co-organizador” do evento, existindo elementos que faziam parte de ambas as equipas (CNBDI e ABD). A inauguração da Bedeteca da Amadora em 2014 veio esvaziar de alguns “poderes” e relevância o CNBDI, o qual foi pouco tempo depois desactivado. A sua sede foi cedida ao CPBD (Clube Português de Banda Desenhada) , mantendo desta forma a ligação do local à BD. As Falhas estruturais de um processo autofágico Ao longo do reinado do arquitecto tem sido evidente a sua incapacidade de se adaptar às mudanças que aconteceram no mercado da BD nacional, mudanças essas que vêm sendo construídas à revelia do que sucede na Amadora. Nos últimos anos os autores e a suas obras passaram a ser secundários no festival, o qual privilegia a experiência museológica concebida por Nelson Dona e seus comissários, sendo executada pelos seus cenógrafos para realçar os célebres três pilares de Dona Incompetência.
Isto não é uma mera implicância deste escriba. Os pilares – exposição temática, PNBD e efemérides, fazem com que o festival viva virado para o passado, transformando-o numa experiência previsível e desligada do mercado que deveria promover. Algo que começou a ser evidente quando existiram cortes no orçamento do festival, não só devido aos cortes efectuados, mas porque não existiu capacidade para minimizar os danos que eles causaram.  Cortes orçamentais não explicam tudo. Meio milhão de euros permite fazer mais do que aquilo que tem estado patente na Amadora, é questão de existir uma gestão mais competente. Já mencionei duas situações que empobrecem o festival e podiam ser geridas de uma forma mais eficaz: a presença de autores desconhecidos e a exposição dos livros, mas existem outras situações. Por exemplo, o site amadorabd.com. Um site conceptual que todos os anos é diferente, não é funcional, nem é rentável de um ponto de vista económico. A Câmara da Amadora anda todos os anos a pagar um site novo. Se tivesse um site que mantinha o mesmo design de ano para ano, ao invés de pagar a despesa de concepção de um site novo limitava-se a pagar o valor  da sua manutenção, uma despesa que é sempre menor. O trabalho de manutenção poderia ser realizado por elementos do festival, não necessitando de ser feito por uma agência contratada, existem situações que é só uma questão de inserir conteúdos. O motivo porque o director optou pela opção mais dispendiosa deve residir no aspecto “temático” do festival, algo que também deve suceder com o projecto de arquitectura. No Kuentro, Machado dias questionou-se “porque raio de razão o Festival da Amadora tem de mudar de visual arquitectónico todos os anos? Para satisfazer clientelas de projectistas? Para sacar mais verbas à Câmara?” Machado Dias não sabe responder, mas relembra que ”a grande maioria dos Festivais Internacionais mantém a sua disposição no terreno praticamente inalterada ao fim de anos de edições.” A comparação com outros eventos internacionais de renome também pode ser feita a nível da cenografia, outro dos capítulos onde a Amadora investe bastante. Ao contrário de outros festivais, na Amadora cada ano que passa se torna mais evidente que a banda desenhada serve de desculpa para promover a visão dos comissários, o trabalho dos cenógrafos, de projectos arquitectónicos e de gabinetes de design, quando o que deveria existir era uma utilização destes recursos para promover a BD. Quando existe uma redução orçamental não faz sentido investir no supérfulo e desinvestir no essêncial, mas é o que acontece na Amadora. Mesmo nos últimos anos em que não consta ter existido uma redução orçamental, cada vez o investimento em autores (e outros “detalhes”) é menor e deixado sempre para a última hora.
Um dos maiores problemas do festival é o seu director ter as prioridades trocadas. Insiste numa perspectiva conceptual do evento enquanto experiência museográfica, a qual se tem revelado ser uma opção mais cara e ineficaz, empobrecendo o festival e a sua herança. Existem alternativas para realizar um festival de meio milhão de euros com mais interesse para o público, mais capacidade de promover o nome da cidade e contribuir para a promoção e crescimento do mercado e a projecção da BD enquanto arte em Portugal. Só que no AmadoraBD a escolha recai sempre em opções que, analisadas de um ponto de vista operacional e financeiro, parecem revelar incompetência ou má gestão de fundos camarários, ou ambas. Contudo, a Câmara Municipal da Amadora parece estar satisfeita com o trabalho do arquitecto, o qual segundo consta até não se limita a ser só director do festival e também desempenha outras funções para as quais está habilitado, devido à sua formação académica. Pode ser que nesses outros cargos demonstre uma competência que não é visível no campo da banda desenhada, onde não parece ter aprendido nada com o que sucedeu na Bedeteca de Lisboa. As políticas que está a colocar em prática na Amadora só servem para alimentar um proceso autofágico que se vem desenrolando há anos. Um festival que está de costas viradas para o mercado está também de costas voltadas para o público, o que o transforma num evento incapaz de captar o interesse do público, o que acaba sempre por o condenar à morte. O saudosismo da glória que não existiu Quando se começa a analisar as opções de Nelson Dona, no AmadoraBD, começa a parecer que ele aspira a ser um João Paulo Cotrim, mas falta-lhe a competência para chegar a esse nível, motivo porque o AmadoraBD se tem transformado numa versão rasca do Salão de Lisboa,  sem identidade própria,assolado  por um caos crónico, um evento despersonalizado que esqueceu a sua história e o seu público que o visitava. Existem muitas situações em que se pode criticar ou discordar da opções de Cotrim. Contudo,tinha uma visão que era clara e debatível. No caso de Dona não se pode dizer o mesmo. Mas existem diversas situações que permitem ver que ele aprecia o conceito que foi implementado sem sucesso em Lisboa. Basta relembrar que uma das primeiras medidas que implementou foi a instituição dos prémios de ilustração infantil, algo que veio trazer a ilustração para o AmadoraBD à semelhança do que acontecia no Salão de Lisboa,. A segunda medida foi a contratação de Costa & Moura, os quais foram coloborador da Bedeteca de Lisboa até à sua extinção. Algumas pessoas têm saudades dos tempos “áureos” da Bedeteca,. Na verdade,  o único legado que Cotrim deixou na Bedeteca de Lisboa foi a transformação de Farrajota, o qual era um licenciado em gestão e passou a ser um  bibliotecário anónimo, quarentão e saudosista dos tempos em que o Sr. João Soares era Presidente. É que nessa altura é que as coisas eram boas! Pelo menos para alguns… Todos os fundos que foram gastos pela Bedeteca, seja no tempo de Cotrim seja no de Rosa Barreto, não serviram para construir qualquer infraestrutura que perdurasse. Amorte lenta daquele serviço só foi sentida por aqueles que lá trabalhavam ou colaboravam, uma vez que o público não se importou muito com o seu desaparecimento. Opções estratégicas Existem duas opções na gestão de fundos públicos para as artes:
    • Promover uma elite, organizando eventos e publicando autores que uma minoria na sua sapiência intelectual e académica adora, mas a genralidade do público ignora, muitas vezes com bons motivos.
        • Promover um mercado de qualidade, em que o mais importante não é realizar algo para agradar à elite dos “críticos”, mas apresentado eventos e autores diversificados e com qualidade.
O modelo utilizado pela Bedeteca foi o primeiro, o modelo utilizado pelo AmadoraBD costumava ser o segundo, mas progressivamente tem  vindo a transformar-se em algo que se enquadra no conceito que uma “elite” adora, mas que não interessa ao público. Ao contrário da fama que possuí, o AmadoraBD sempre apresentou uma selecção diversificada de autores, embora existisse uma clara preferência pelo eixo franco-belga. Autores  como Morris, Manara, Bilal, Meziéres, Comés, Miguelanxo Prado, Miguel Ángel Martin, Max, Will Eisner ou Cosey, entre outros, só tem em comum o facto de serem grandes nomes da banda desenhada, os seus estilos e as temáticas que abordam são distintos. Contudo, eram grandes nomes da Banda Desenhada, a maioria publicada em Portugal, ou então eram nomes grandes da BD alternativa nos seus países. Max e Miguel Angél Martim, os quais foram editados pela primeira em Portugal este anos, eram dois dos nomes de referência da La Cúpula, editora espanhola que publicava a revista Él Vibora, eram autores relevantes naquele contexto histórico e, parcialmente conhecidos, em Portugal devido a importações de material brasileiro, como a revista Animal, ou mesmo material original espanhol. Existiram sempre alguns nomes desconhecidos no festival, mas isso era numa época em que o mercado nacional era muito pequeno, existia um ritmo de edições baixos. Apesar disso, os nomes mais relevantes que eram editados em Portugal estiveram presentes ao longo de uma década. Foi no novo século que os grandes nomes desapareceram e só ficaram os desconhecidos, apesar de, como tem sido referido neste artigo, estarem a ser publicados em Portugal um número elevado dos mais consagrados e promissores nomes da BD internacional. Foram os grandes nomes que transformaram o festival numa inevitabilidade. Atraíam público. É devido a esse público e a esses autores é que o festival ganhou projecção nacional e internacional. Mesmo que algumas  pessoas preferissem utilizar o orçamento do festival em outras iniciativas da Câmara Municipal da Amadora, esta não podia deixar de o realizar, porque nenhum outro evento do município tinha a mesma projecção mediática, internacional e capacidade de captar público. Mas o AmadoraBD só é uma inevitabilidade até ao dia em que o deixar de ser, enquanto o público não o abandonar. O que tem vindo a acontecer ao longo dos últimos anos tem sido um delapidar progressivo da herança do festival. É a morte lenta há muito anunciada, por entre questões políticas, de orçamento, vontade e escolha das pessoas erradas pelas razões erradas. Quando a organização se torna um fardo em vez de um prazer, é o que acontece. – Nuno Duarte Política Amadora Uma das desculpas usuais para a organização caótica do festival é a burocracia camarária. Algo que em parte também é real, embora não eximam de culpas um director que ao final de 28 anos ainda não aprendeu como  a contornar, nem parece conseguir explicar ao executivo camarário as vantagens de ter uma organização mais eficiente no festival. Existem também responsabilidades do executivo liderado por Carla Tavares, o qual tem uma maioria absoluta, uma vez que ela é responsável pela política cultural do conselho da Amadora.
Neste artigo vou deixar de lado considerações sobre questões politíco-partidária, ou alongar-me sobre questões relativas à  gestão do município da Amadora.  Existem opções do executivo camarário a nível das opções estratégicas para o sector das obras públicas e adjudicação das mesmas que vão afectar o festival, mesmo que indirectamente. Contudo isso são questões que, para serem devidamente abordadas, implicavam um pesquisa mais aturada e um conhecimento mais profundo da vida no concelho da Amadora. Para além disso, como o foco do aCalopsia é a banda desenhada, vou só frisar algumas questões relativas à política cultural, onde o AmadoraBD deveria estar inserido. Nas crónicas publicada aqui no aCalopsia, Pedro Mota fala várias vezes como “esperava que a Amadora apostasse na banda desenhada como factor de identidade e diferenciação”, um termo meio académico e que creio necessitar de uma pequena explicação. Antes de o AmadoraBD se transformar no principal evento cultural da cidade, a Amadora já possuía uma longa ligação à BD e, actualmente, desenvolve ao longo do ano outras actividades relacionadas com esta área. Seria normal o munícipio ter uma política cultural e de promoção do conselho que aproveitasse essa ligação e a projecção que a BD lhe concede. Contudo não é isso que acontece. As actividades que existem são dispersas e não se vislumbra qualquer programa que maximize o prestigio que o festival alcançou, em outros tempos. Tendo em conta o orçamento do festival, seria de esperar que o executivo camarário aproveitasse ao máximo esse investimento. Faria mais sentido existir um projecto para as actividades no conselho aproveitando a marca AmadoraBD, as plataformas que existem para a sua promoção, como a sua presença nas rede social  e a página web, a tal que é um desperdício de dinheiro no modelo em que existe actualmente. Um reavivar do projecto da Amadora para a BD seria algo positivo- Contudo, nesta altura a maioria das pessoas já ficaria satifeita se o municipio revertesse o processo autofágico em que o festival se encontra. Travar esse processo implica a existência de uma opção clara por um modelo inspirado no raiz popular que o festival teve, adaptado à realidade do mercado da actual, renegando o modelo anacrónico que foi instaurado. Depende de Carla Tavares e do vereador da cultura, caso tenha algo a dizer na matéria, definir qual é que deve ser a prioridade na aplicação dos fundos camarários disponibilizados para a BD: promoção dos intervenientes e da qualidade da BD portuguesa ou promoção de um conceito abstracto que é do agrado de meia dúzia. Aquilo que sucedeu nos PNBD 2017 é só o reflexo daquilo em que o festival se está a transformar: uma festa privada, organizada sem critério e onde impera o gosto pessoal de quem tem o poder para decidir. Algo que é prejudicial para o AmadoraBD, não contribui para a promoção da BD, nem para o crescimento do mercado ou o prestigio de quem o organiza. Existem questões que estão dependentes do poder político, mas outras estão dependentes de diversos agentes, nomeadamente dos autores e editores, porque a dialéctica chiliana só serve uns eleitos. Por isso talvez seja hora de os autores e editores falarem sobre aquilo que é realmente importante: a qualidade e o mercado
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