Vingadores Cósmicos: Para Bendis são Guardiões da Terra e não da Galáxia

O crime capital de Bendis em "Vingadores Cósmicos" é ter transformado os Guardiões da Galáxia nos “Guardiões da Terra”: a história está presa à Terra, sendo aí que se desenrola grande parte da narrativa

Os Guardiões da Galáxia era uma equipa de heróis obscuros que se viram catapultados para o estrelato, ao serem escolhidos para figurar num dos filmes dos estúdios Marvel.

O seu percurso sinuoso na BD já aqui foi narrado, pelo que vou salientar só um facto relevante: é a dupla Dan Abnett e Andy Lanning (DnA) que, em 2008, acaba por criar aquela que seria equipa base dos Guardiões, como os conhecemos hoje. E é essa a equipa que está na origem do filme. Contudo, a qualidade do trabalho da dupla de argumentistas foi suficiente para convencer os executivos do estúdio cinematográfico, mas só teve uma recepção calorosa por parte de um número pequeno de apreciadores de BD.

Quando a Marvel resolveu relançar o título para capitalizar na publicidade que o filme iria gerar, resolveu socorrer-se de um seus mais populares argumentistas: Brian Michael Bendis, que sendo aclamado por muitos, e com tendo escritos várias séries de sucesso, não era conhecido por escrever histórias de ficção científica… e nota-se.

Existem recursos estílistico de Bendis que são irritantes para alguns: excesso de exposição, reescrever o passado, descompressão e ignorar a continuidade, entre outros. O seu trabalho em Guardiões da Galáxia sofre de todos esses males e mais alguns.

O crime capital de Bendis é ter transformado os Guardiões da Galáxia nos “Guardiões da Terra”: a história está presa à Terra, sendo aí que se desenrola grande parte da narrativa – o primeiro capitulo (à excepção de três pranchas) decorre na totalidade numa quinta. Quando se usa Galáxia no título, situar a acção numa quinta na Terra, é no mínimo uma opção original e capaz de decepcionar quem espera encontrar uma space opera que explore galáxias longínquas.

Os Guardiões nunca tiveram um conceito forte ou uma origem “definitiva”, e a equipa montada por DnA é uma manta de retalhos constituída por diversas personagens com passados (e criadores) distintos. Para lhes dar um propósito e uma missão, Bendis transforma-os em protectores do planeta Terra, algo que até poderia funcionar bem se eles não habitassem no Universo Marvel.
A transformação da equipa em protectores da Terra em vez de elevar o estatuto dos Guardiões acaba por os diminuir; afinal no Universo Marvel, a Terra já foi salva centenas de vezes dos maiores perigo cósmicos por equipas como Vingadores, X-Men, Quarteto Fantástico e outros. Acaba por não existir um motivo muito válido para justificar a permanência dos Guardiões como protectores da Terra quando já existe uma abundância de heróis que cumpre essa tarefa.

Numa cena em que Bendis pretende mostrar qual a importância e perigo que a Terra constitui para o resto da Galáxia, são enumeradas as inúmeras ameaças cósmicas que o planeta já enfrentou e derrotou. Nenhuma dessas ameaças foi derrotada pelos Guardiões, que na maioria dos casos nem tiveram qualquer tipo de participação nessas sagas. Ao trazer o foco da acção para a Terra, Bendis acaba por realçar o facto de os Guardiões terem sido até agora uma equipa de segunda linha, no mínimo, no Universo Marvel.

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Ao núcleo duro da equipa (Senhor das Estrelas, Drax, Gamorra, Rocket Raccoon e Groot) o argumentista adiciona o Homem de Ferro, que sendo até agora mais popular do que os restantes, dentro da BD e fora dela, acaba por não adicionar nada à equipa – acaba aliás por retirar espaço para explorar a dinâmica entre os restantes elementos. Nunca chega a ser indicado um motivação minimamente válida para Tony Stark se juntar a este grupo de (agora) renegados, mas como também não são explicados os motivos para os restantos elementos estarem juntos, até acaba por encaixar na restante narrativa.

A aposta da Marvel em Guardiões da Galáxia foi forte e, para além, de um argumentista popular, a editora escolheu um artista popular: Steve McNiven, que ilustrou entre outros trabalhos o êxito de vendas que foi Guerra Civil. O maior problema de McNiven é o facto de não ser um desenhista capaz de ilustrar 20 pranchas mensais, algo que obrigou a Marvel a recorrer a Sara Pichelli a partir do 3º capitulo, para manter a revista com a periodicidade que desejava. Curiosamente, a arte de Pichelli acaba por se mostrar mais adequada a um título de ficção científica, mesmo com super-heróis, do que a de McNiven.

Os primeiros quatro capítulos de Vingadores Cósmicos acabam por ser decepcionantes. Basicamente servem para que se estabeleça o lugar dos Guardiões da Galáxia como fugitivos de um império galáctico. Contudo, é mais eficaz a estabelecer o drama familiar entre Peter Quill (o Senhor das Estrelas) e o seu pai – que parece uma birra infantil de dois adultos – que em criar uma conspiração galáctica de dimensões épicas.

O único factor que redime este volume é o 5º “capítulo” que na verdade são quatro histórias curtas centradas em cada um dos protagonistas. Originalmente publicada numa edição especial intitulada Guardians of the Galaxy: Tomorrow Avengers One Shot, esta história demonstra que Bendis, apesar de ser um mestre da descompressão capaz de estender uma história por uma infinidade de tempo desnecessária, também sabe escrever histórias curtas.

Estas histórias até acabam por ser aquilo que alguém esperava de uma história dos Guardiões: histórias de ficção-científica, que não sendo exactamente originais, entretêm e levam o leitor para mundos distantes. Acabam por ser também aquelas histórias que têm uma arte melhor, em particular aquelas ilustradas por Michael Del Mundo, a solo ou em parceria com Yves Bigerel.

Infelizmente sabe a pouco, em particular porque estas histórias são eficazes em criar expectativa para a reunião dos Guardiões, só que nós já lemos o resultado dessa reunião nas páginas anteriores e decepcionou.

Guardiões da Galáxia Vol. 01: Vingadores Cósmicos

Argumento: Brian Michael Bendis

Desenho: Steve McNiven, Sara Pichelli, Michael Oeming, Yves Bigerel, Ming Doyle, Michael Del Mundo

Arte-Final: John Dell, Sara Pichelli, Steve McNiven, Michael Oeming, Ming Doyle, Michael Del Mundo

Cor: Justin Ponson, Rain Beredo, Javi Rodríguez, Michael Del Mundo

Republica: Guardians of the Galaxy 0.1, Guardians of the Galaxy Nº01-03, Guardians of the Galaxy: Tomorrow Avengers One Shot

Editora: Panini

PVP: 10,95€

Distribuição: 28/05/2014

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2 Comments

  1. says: Joao Rosa

    Esta foi, para mim, das melhores histórias da Marvel Now. Gostei sobretudo da origem da personagem principal contada no primeiro número.

    Não achei descabida a ideia de o primeiro arco de história se centrar na protecção da Terra, já que este é o pontapé de saída de uma série que quer desesperadamente chegar ao mainstream, uma tarefa que não vai ser nada difícil tendo em conta o tipo de personagens que aqui encontramos. O Peter Quill e Tony têm grandes ligações à Terra, pelo que era uma maneira um bocado óbvia de começar esta série.

    Quanto ao Bendis, é uma questão de gosto. Eu gosto do estilo dele precisamente por causa do excesso de diálogos. Dá uma certa fluidez à acção, se bem que concordo que certas figuras de estilo que ele usa são desnecessárias.

    Espero que a Panini continue a editar esta série.

  2. says: Diogo Semed

    Bendis devia andar a terminar Scarlet e não a perder tempo com estes “reboots”. ‘Nuff Said

    Entre o volume da série Universo Marvel da Levoir e este da Panini sem dúvida que prefiro o primeiro pelo respeito que os argumentistas têm por toda a continuidade, sendo o único senão o de ter tanta informação anterior que é necessário conhecer para compreender certos aspectos da trama.

    É uma pena não ter direito a um volume 2 como o Cap: Winter Soldier (a distribuidora Devir deve andar a preparar uma batelada de hardcovers do volume 2 para enviar para as FNACS nas próxima semanas ,-p )

    Como adenda aconselho todos a procurarem dois outors títulos a mini série Annihilation Conquest: Star Lord e Annihilators: Rocket Raccon & Groot (publicado em back up de uma outra mini-série).

    Tanto uma como outra são fulcrais para apreciadores desta série e o artista, Timothy Green II, mete o Paul Pelieter, McNiven e Pichelli a um canto tal é a sua originalidade, criatividade e qualidade.

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