A edição digital

“The Infinite Canvas – Digital Comics” é o capítulo final de “Reinventing Comics”, livro publicado no ano 2000, da autoria de Scott McCloud. Nesse capítulo, McCloud aborda a banda desenhada no estado puro, como informação, e assume a “tinta no papel” como apenas uma das formas físicas que a banda desenhada pode tomar, considerando que a transformação para os “digital comics” possibilita uma melhor compreensão do conceito de banda desenhada, para além da técnica ou tecnologia que o condiciona.

McCloud antecipa as possibilidades da banda desenhada na “era digital”, procurando evidenciar aquelas que passarão a condicionar a definição de banda desenhada no futuro. Neste aspecto, McCloud rejeita as aproximações à linguagem do cinema (introdução do som e de animação), aceitando um maior desenvolvimento no sentido do multimédia. Para o autor, o ecrã não pode deixar de ser visto como uma janela, o que irá revolucionar a forma de leitura da banda desenhada. Num ambiente digital, a leitura a banda desenhada poderá fazer-se, verdadeiramente, em todos os sentidos. Daqui, McCloud conclui que as possibilidades são maiores do que as potenciadas pela impressão em papel.

Mais de uma década mais tarde, após um período de grandes hesitações, a banda desenhada digital começa, finalmente, a conseguir alcançar alguma expressão. Isto coloca dois tipos de questões a uma cidade como a Amadora, que tem um projeto de identidade ligado à banda desenhada. Por um lado, questiona-se como apresentar a BD digital no ambiente de um festival de banda desenhada. Por outro lado, obriga a algum esforço de atualização, para estar a par do que está a acontecer neste domínio. No que respeita à primeira questão, é curioso verificar que uma das abordagens que os festivais encontraram é, justamente, a aproximação à linguagem do cinema, nomeadamente a criação de uma banda sonora para a apresentação pública.

Em 2013, o AmadoraBD procurou responder às duas questões, promovendo uma exposição/instalação de BD digital, um workshop sobre a criação de BD digital (especialmente vocacionada para profissionais), e a vinda de dois convidados internacionais de reconhecido mérito: Jean-Christophe Lopez e Stéphane Corbinais, editores, respetivamente da Six Pieds Sous Terre (que publicou Paulo Monteiro em França) e da Bang, e que juntos desenvolveram o projeto de edição de BD digital AlterComics (França).

Uma vez mais, falhou a promoção e a divulgação do trabalho desenvolvido pelo festival.
Mas, independentemente das falhas da abordagem no passado, importa aprofundar esta aposta para o futuro. Num exemplo simples, a ideia de premiar um webcomic, que este ano foi abandonada pelos prémios profissionais de banda desenhada, faria sentido no âmbito (mais representativo) dos Prémios Nacionais de Banda Desenhada, promovidos pela cidade da Amadora. E quem diz premiar um webcomic diz premiar uma publicação digital de BD (o que talvez faça mais sentido na óptica da Amadora). E é possível ir mais longe, naturalmente.

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