Razões para ir ao AmadoraBD: A Batalha de Massano

A exposição dedicada ao álbum A Batalha – 14 de Agosto de 1385, publicado pela Gradiva e da autoria de Pedro Massano, assinala o regresso da BD histórico-documental ao espaço central do festival internacional de banda desenhada da Amadora.

Considerando que o género é um daqueles em que mais se notabilizou a banda desenhada portuguesa, e daqueles em que continua a existir alguma (pouca) procura por parte de editores e promotores, este regresso (ainda por cima motivado pela distinção com um Prémio Nacional de Banda Desenhada) é muito relevante.

Parece que a banda desenhada portuguesa em nada beneficiou com o tempo de ausência deste género no espaço central do festival, durante o qual a Amadora preferiu apresentar noutros espaços mostras de grande valor como a de Portugal, de Luís Diferr, ou a mostra dedicada aos 70 anos de atividade (na BD) de José Ruy. Inclusivamente, para além de descontinuar o contacto do público com algumas grandes referências do género, deixou de se apresentar a forma como, nos tempos mais recentes, alguns autores procuraram trazer alguma novidade ao género de modo a garantir a sua renovação, continuidade e notoriedade.

Pedro Massano é um desses autores, e ainda bem que A Batalha foi distinguida com um prémio, porque isso permite esta exposição.

O álbum de Massano retrata o dia da batalha de Aljubarrota e, lá está, partiu de uma encomenda. Pedro Massano foi contactado por um responsável da Fundação Batalha de Aljubarrota, pretendendo-se concretizar um livro de banda desenhada que pudesse integrar o conjunto de documentos que o CIBA – Centro de Interpretação da Batalha de Aljubarrota tem vindo a proporcionar.

Para a construção do guião, Pedro Massano socorreu-se de diversas fontes de que fez aquilo que designa por uma “leitura fria”, com destaque (nas transcrições dos originais) para Fernão Lopes (cujo estilo e método cheios de preocupações de expressão narrativa obrigam a um grande trabalho de interpretação), para Froissart (que também é precioso para a interpretação dos textos de Fernão Lopes) e para fontes espanholas, como a carta de D. Juan (rei de Castela) aos murcianos ou os escritos do cronista de D. Juan, Pêro Lopes Ayala. A preocupação de se cingir aos factos históricos verificáveis por fontes documentais existentes (a tal “leitura fria”) passa para o resultado final, mantendo-se, em A Batalha, a preocupação de objetividade na representação de cada um dos lados em confronto.

A história foi decomposta em 86 pranchas, em que as pranchas inicial e final são pranchas singulares, e todas as restantes são pranchas duplas, em que o autor procura deliberada e frequentemente o efeito de, com o livro aberto, alguns desenhos passarem de uma página para a outra, e, sobretudo, tem espaço para corajosas opções de composição e planificação, e para eficazes mudanças de planos, já que Pedro Massano é igualmente forte nos planos descritivos e nos planos narrativos.

A escrita do texto demorou cerca de dois meses, seguindo-se o desenho a lápis (durante pouco mais de um ano), e a arte final, que demorou cerca de quatro anos, de modo a garantir a qualidade do resultado, uma qualidade que resulta também de um criterioso trabalho na legendagem e na aplicação da cor (em tons suaves, que não perturbam a legibilidade do desenho).

A enorme atenção ao detalhe e a perspetiva do dia da batalha permitem a Pedro Massano retirar o maior efeito dramático das emoções humanas (na sua individualidade e no relacionamento entre personagens) e dos acontecimentos, e revelar os heróis do dia (e, afinal, do álbum), o Condestável Nuno Álvares Pereira e D. João, Mestre de Avis.

É, certamente, um trabalho que deve resultar muito bem em termos de exposição.

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