Depois de uma edição parcial da Devir, a Quarto de Jade juntou-se à Pianola Editores para nos trazer a totalidade de “O Livro dos Dias”, uma narrativa gráfica da autoria de Diniz Conefrey (O Síndroma de Babel e outras estórias, Os Labirintos da Água), centrada em Tlacamaye, um tlacuilo, escriba-pintor da tribo mexica-colhua no México pré-colombiano nos finais do século XV, antes da chegada dos conquistadores espanhóis, que, na forma como articula o texto e a imagem, se anuncia como um precursor dos actuais autores de BD.
Baseando-se em vários textos que fizeram chegar até nós o conhecimento e o sentido poético que caracterizaram os povos indígenas da região da antiga Cidade do México, este livro propõe uma formulação que tenta espelhar o ritmo interior destas sociedades pré-colombianas. Contado através de um grafismo espectacular, que vai beber à arte azteca para criar páginas de grande beleza e dinamismo, “O Livro dos Dias” transporta o leitor no tempo e no espaço, para o coração do Império Méxica.
Os mexica-colhua consideravam que as imagens eram mais do que apenas uma representação ou figuração de coisas existentes num outro lugar, num outro tempo. As imagens mexicanas eram designadas para apresentar certos aspectos do mundo divino fisicamente presente e palpável; ultrapassavam uma barreira que os sentidos europeus normalmente não conseguem atravessar. O marcar da pincelada e a disposição das formas e das cores trazia literalmente o universo dos deuses à vida. Existe agora um largo consenso de que a noção de “personagem fixa” das entidades mexicanas tem uma apreensão errada, e de que os mexica e a Mesoamérica em geral, pensavam mais em termos de forças sagradas, com qualidades associadas e graus de manifestação, movendo-se constantemente em completa interacção: maiores grupos de possibilidades invocados por uma gama de nomes do que entidades específicas, com zonas de influencias particulares.
Apesar dos firmes contornos pretos, detalhes iconográficos e cores, gestos veementes e aparentemente balanceadas oposições das entidades nos códices, estas migravam constantemente e intermudavam. Neste sentido as técnicas praticadas pelos tlacuilos eram mais um caminho para o divino do que um meio de expressão. Os cânones pré-hispanicos de selecção e arranjo eram desenhados para ajudar a compreender e extrair o Essencial. Uma imagem tornava “visível” a própria essência das coisas porque era uma extensão dessa essência. É por isso que a instrução religiosa dada aos tlacuilos nas escolas era uma parte indispensável na sua formação artística. Complemento espiritual andava de mão dada com a mestria técnica, como é sugestionado pela dualidade do termo “tinta vermelha-tinta preta”.
O álbum faz parte das edições portuguesas em destaque no site de Paul Gravett, escolhidas por Pedro Moura, e foi uma das 20 obras essenciais de 2014 do aCalopsia.
A edução está disponível para venda directa na Quarto de Jade e Pianola Editores.
[note note_color=”#f2ecdd” text_color=”#353535″ radius=”0″]Ficha técnica: Capa cartonada com badanas, 128 páginas a cores. Formato 21,5 X 30,4 cm. PVP 22.00€. Impresso na Europress em Setembro de 2014, numa tiragem de 300 exemplares.[/note]