Andando eu há muito tempo a reflectir sobre o projecto de BD da cidade da Amadora, já estava convencido de que uma cidade com 200 mil habitantes era um peso pesado. Mas não. O que será um peso pesado no conceito do Nuno Amado? O sistema solar? Laniakea?
Tratando-se de um agente do panorama da BD nacional, arriscava dizer que o peso pesado no conceito do Nuno Amado é… o Nuno Amado.
Para quem não sabe, o Nuno é aquele leitor que tem um blogue de divulgação de banda desenhada, em que, numa escala de zero a dez, dá notas aos livros que vão normalmente do 9,5 ao 11,5.
Convenhamos que não seria difícil fazer uma crónica apontada ao Nuno. Depois do sucesso do editorial do Bruno Campos sobre o Marcos Farrajota, parece ser o tipo de coisa que as pessoas gostam de ler. Acresce que, como todas as pessoas que habitam na internet e fora dela, o Nuno Amado tem defeitos. Tem um blogue pimba, é completamente parcial (apesar de o tom apaixonado ser uma das virtudes do seu blogue, a paixão cega-lhe completamente a capacidade de análise), tem aquela noção que a formiga faz de si própria (diz que faz muito mais do que a sua obrigação, e se não fala francês ou se não alcança Hugo Pratt, é o resto da humanidade que está mal), e tem aquela coisa esquisita de partilhar connosco os momentos de intimidade em que conversa com a mulher como se só a conhecesse da internet.
Mas, feito um tal exercício, a BD ganharia alguma coisa? Penso que não.
A BD ganha com a pluralidade. Ganha com a existência de blogues como o Leituras de BD, em que se conclui que todo o autor de formas femininas generosas é um “bom desenhador”, lado a lado com blogues como o aCalopsia. E havendo vantagem nessa pluralidade, há vantagem em que cada um saiba não só o seu lugar, mas também que não está sozinho.
O meu objectivo com o aElipse não é andar à procura de categorias de peso para me meter com alguém. E no estado em que a BD portuguesa se encontra, com muitos pontos de interesse e com muitas dificuldades, não estarei muito longe da verdade se afirmar que neste momento estamos todos muito longe do peso ideal. Faltam condições de mercado. E faltam condições para lá das condições de mercado.
No projecto da cidade da Amadora para a banda desenhada, procuraram criar-se algumas destas condições. Há uma equipa que trabalha todo o ano com banda desenhada, há o CNBDI que, entre outras importantes missões, serve de arquivo histórico de originais de BD, há o mais importante e prestigiado festival de banda desenhada (que este mês apresenta a sua 25ª edição, o que é um registo impressionante para uma iniciativa cultural). E há algumas interrogações sobre outras destas condições, por condicionalismos de meios e por falta de uma verdadeira estratégia.
Acredito que se a Amadora alinhar as condições que dependem do seu projecto, serão criadas novas condições de mercado. Talvez aí possamos falar de pesos pesados.
E é nisto que me tenho centrado: na necessidade de a Amadora voltar a fazer planos para a banda desenhada que vão além dos dias do festival ou do exercício anual.
Qual é – a médio e longo prazo – o plano que a Amadora tem para se afirmar, e afirmar a sua identidade, através da sua (histórica) ligação com a banda desenhada?
Quando esse peso pesado aparecer, logo vemos se tenho medo de me meter com ele. E se tiver, é bom sinal. Numa escala de zero a dez, não me rendo por menos de uma nota cem!